KnoWhy #570 | Junho 21, 2020

Por que Alma viu a Deus cercado de anjos?

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Scripture Central

"Sim, parecia-me ver, assim como nosso pai Leí viu, Deus sentado em seu trono, rodeado por inúmeras multidões de anjos na atitude de cantar e louvar a Deus; e minha alma sentia o desejo de lá estar" Alma 36:22

O conhecimento

O ápice do relato quiástico e magistral de Alma sobre sua conversão revela como, em meio ao terrível tormento por seus muitos pecados, ele se lembrou e invocou a Jesus Cristo, o Filho de Deus, por misericórdia (Alma 36:17-18).1 A partir daquele momento, sua alma foi transformada, de um estado anterior onde "a simples ideia" de estar na presença de Deus "atormentava [sua] alma com inexprimível horror" (Alma 36:14), a um estado em que era digno de ver Deus em seu trono, e até desejava estar lá com Ele (Alma 36:22). Portanto, a história de Alma é um exemplo inspirador do poder transformador que o arrependimento e a conversão a Cristo podem ter na vida das pessoas.

No entanto, cada vez mais estudiosos reconhecem que a história de Alma é muito mais do que apenas um relato sobre arrependimento. “Se a intenção do capítulo [Alma 36] fosse apenas ensinar arrependimento”, observou Kevin Tolley, “seria mais condizente com seu filho mais novo, Coriânton”.2 Ao prestar atenção cuidadosa aos detalhes tanto em Alma 36 quanto em Mosias 27, Tolley observa que a conversão de Alma também segue o padrão estabelecido nas antigas narrativas de chamados proféticos.3 Na Israel antiga, nos dias de Leí e Néfi, o chamado profético típico culminava no profeta, em meio à hoste celestial de Deus, vendo e ouvindo os decretos do conselho divino (ver Jeremias 23:16-18).4

Por conseguinte, como tem sido amplamente discutido ao longo da última década, Néfi começou seu registro relatando a visão de seu pai sobre Deus em seu trono, cercado pelas hostes celestiais, estabelecendo sua legitimidade como profeta (1 Néfi 1:8-15).5 No relato de Alma a seu filho Helamã, ele cita vinte e uma das palavras de Leí, na mais longa citação direta de um autor de um Livro de Mórmon a outro: "Sim, parecia-me ver, assim como nosso pai Leí viu, Deus sentado em seu trono, rodeado por inúmeras multidões de anjos na atitude de cantar e louvar a Deus; e minha alma sentia o desejo de lá estar"(Alma 36:22; cf. 1 Néfi 1:8).6

Ao citar o chamado profético de Leí e o relacionar a própria experiência, Alma demonstrou que ele também "recebeu conhecimento celestial e foi comissionado a pregar uma mensagem divina" pelo mesmo padrão que Leí e outros profetas antigos.7 A partir deste momento, Alma e os filhos de Mosias dedicaram-se a "proclama[r] a todo o povo as coisas que haviam ouvido e visto"(Mosias 27:32), uma frase típica das narrativas antigas sobre os chamados proféticos israelitas.8

Mark Alan Wright também observou que alguns dos aspectos da experiência de Alma correspondem a antigos padrões para tornar-se um profeta e curandeiro em várias culturas das américas.9 Dessa maneira, a comissão profética de Alma se encaixa tanto no padrão de seus antigos ancestrais israelitas e nefitas, quanto nas expectativas que eram provavelmente exigidas por seus antigos contemporâneos americanos.

O porquê

Compreender o relato de Alma como um relato de chamado profético, muito além de uma história de arrependimento e conversão, esclarece o motivo de ter feito este relato a seu filho Helamã, que era seu filho mais velho e um homem justo, ao invés de tê-lo feito a seu filho Coriânton, que tinha maior necessidade de aprender sobre o poder do arrependimento. Como Tolley explicou: "Considerando a mensagem subjacente de um chamado profético, parece apropriado que Alma relatasse a história a seu filho mais velho, Helamã, o provável herdeiro de seu ministério profético".10 Quando o anjo encarregou Alma de "não mais procur[ar] destruir a igreja de Deus" (Alma 36:11) e então Alma saiu e "[trabalhou] sem cessar" para "trazer almas ao arrependimento" (Alma 36:24), Alma chamou e encarregou seu filho Helamã de "cuidar destas coisas sagradas" e dirigir-se ao "povo e proclama[r] a palavra" (Alma 37:47).

Além disso, os relatos de chamados proféticos usam palavras características que confirmam a majestade e a autoridade pelas quais os chamados proféticos são feitos. Frequentemente falam da glória, poder, luz e voz de Deus, assim como da sensação avassaladora de inadequação que os profetas sentem ao receberem seu chamado (ver Isaías 6:1-5). Desta maneira, Alma emprega em Alma 36 muitas das mesmas palavras-chave — como os termos anjo, voz de trovão, levante-se e colocar-se de pé, nascido de Deus, misericórdia, luz maravilhosa, lembrar, cativeiro, pais, servidão e livrar, que o anjo havia usado ao falar com Alma na ocasião de sua conversão e ao conferir-lhe autoridade, juntamente aos quatro filhos do rei Mosias (ver Mosias 27:16).11 Palavras semelhantes foram usadas, com propósitos semelhantes, por Isaías e Leí ao declararem sua grande admiração pelas grandes obras de bondade e misericórdia de Deus como resultado de suas aparições diante do trono de Deus (ver 1 Néfi 1:14).

Posteriormente, Alma transmitiu os símbolos tangíveis da autoridade profética — os registros sagrados, a Liahona e os intérpretes a Helamã — provavelmente, em um ato cerimonial (Alma 37).12 Alma transmitiu estes registros a Helamã, como Deus havia mostrado e confiado o livro celestial a Leí (1 Néfi 1:11). Ao relembrar o início da teofania do trono de Leí, Alma evocou o final dessa história, na qual Leí fielmente "se dirigiu ao povo e começou a profetizar e a declarar as coisas que vira e ouvira" (1 Néfi 1:18). Por meio dessas expressões literárias e cerimônias de transmissão, "Helamã é apresentado como o sucessor de Alma na linhagem de profetas nefitas".13 O manto profético foi efetivamente passado de Alma para seu filho mais velho, e este momento se torna, em todos os aspectos, o chamado profético de Helamã e seu comissionamento.

Leitura Complementar

Kevin L. Tolley, “Alma 36: A Call to Repentance, a Prophetic Call”, em Give Ear to My Words: Text and Context of Alma 36–42, ed. Kerry M. Hull, Nicholas J. Frederick y Hank R. Smith (Salt Lake City y Provo, UT: Deseret Book y BYU Religious Studies Center, 2019), pp. 297–320. Stephen O. Smoot, “The Divine Council in the Hebrew Bible and the Book of Mormon”, Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 27 (2017): pp. 155–180. Kevin L. Tolley, “To ‘See and Hear’”, Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 18 (2016): pp. 139–158. Mark Alan Wright, “Nephite Daykeepers: Ritual Specialists in Mesoamerica and the Book of Mormon”, em Ancient Temple Worship: Proceedings of the Expound Symposium, 14 de maio de 2011, ed. Matthew B. Brown et al. (Salt Lake City y Orem, UT: Eborn Books e Interpreter Foundation, 2014), pp. 248–252.

1. Consulte o artigo da Central do Livro de Mórmon, “Por que Alma foi convertido?KnoWhy 144 (24 de junho de 2017). Ver também John W. Welch, “Chiasmus in Alma 36”, FARMS Preliminary Report (1989); John W. Welch, “A Masterpiece: Alma 36”, em Rediscovering the Book of Mormon: Insights You May Have Missed Before, ed. John L. Sorenson y Melvin J. Thorne (Salt Lake City y Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1991), pp. 114–131; Noel B. Reynolds, “Rethinking Alma 36”, em Give Ear to My Words: Text and Context of Alma 36–42, ed. Kerry M. Hull, Nicholas J. Frederick y Hank R. Smith (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book y BYU Religious Studies Center, 2019), pp. 451–472. 2. Kevin L. Tolley, “Alma 36: A Call to Repentance, a Prophetic Call”, em Give Ear to My Words: Text and Context of Alma 36–42, ed. Kerry M. Hull, Nicholas J. Frederick e Hank R. Smith (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e BYU Religious Studies Center, 2019), p. 308. 3. Ver Tolley, “Alma 36”, pp. 297–309; Kevin L. Tolley, “To ‘See and Hear’”, Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 18 (2016): pp. 148–150. 4. Ver Tolley, “See and Hear”, pp. 139–143; Tolley, “Alma 36”, pp. 298–302. Consulte o artigo da Central do Livro de Mórmon, “Como Deus chamava os profetas nos tempos antigos? (1 Néfi 15:8)”, KnoWhy 17 (22 de janeiro de 2016). 5. Tolley, “See and Hear”, pp. 143–145. Ver também John W. Welch, “The Calling of a Prophet”, em First Nephi, The Doctrinal Foundation, ed. Monte S. Nyman e Charles D. Tate Jr. (Provo, UT: Religious Studies Center, Brigham Young University, 1988), pp. 35–54; John W. Welch, “The Calling of Lehi as a Prophet in the World of Jerusalem”, em Glimpses of Lehi’s Jerusalem, ed. John W. Welch, David Rolph Seely e Jo Ann H. Seely (Provo, UT: FARMS, 2004), pp. 421–448; Stephen D. Ricks, “Heavenly Visions and Prophetic Calls in Isaiah 6 (2 Nephi 16), the Book of Mormon, and the Revelation of John”, em Isaiah in the Book of Mormon, ed. Donald W. Parry y John W. Welch (Provo, UT: FARMS, 1998), 171–90; Blake T. Ostler, “The Throne-Theophany and Prophetic Commission in 1 Nephi: A Form-Critical Analysis”, BYU Studies 26, no. 4 (1986): pp. 67–95. 6. Ver Tolley, “Alma 36”, p. 303. Ver também John W. Welch, “Textual Consistency”, em Reexploring the Book of Mormon: A Decade of New Research, ed. John W. Welch (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1992), pp. 21–22; Joseph M. Spencer, An Other Testament: On Typology, 2º. ed. (Provo, UT: Neal A. Maxwell Institute for Religious Scholarship, 2016), p. 9. A citação de vinte e duas palavras de Samuel, o Lamanita, em Helamã 14:12, do anjo no discurso do rei Benjamim em Mosias 3:8, está relacionada a citação igualmente longa de Leí feita por Alma, quando a palavra of (de, em inglês) é restaurada em Mosias 3:8, conforme estabelece o "Critical Text of the Book of Mormon", de Royal Skousen. 7. Stephen O. Smoot, “The Divine Council in the Hebrew Bible and the Book of Mormon”, Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 27 (2017): pp. 174–175. Ver também Tolley, “See and Hear”, pp. 148–150; Tolley, “Alma 36”, pp. 302–303. 8. Sobre o significado da frase "ouvido e visto" ou "visto e ouvido", ver Tolley, "See and Hear”, pp.139–143. 9. Ver Mark Alan Wright, “Nephite Daykeepers: Ritual Specialists in Mesoamerica and the Book of Mormon”, em Ancient Temple Worship: Proceedings of the Expound Symposium, 14 de maio de 2011, ed. Matthew B. Brown et al. (Salt Lake City e Orem, UT: Eborn Books e Interpreter Foundation, 2014), pp. 248–252; Mark Alan Wright, “‘According to Their Language, unto Their Understanding’: The Cultural Context of Hierophanies and Theophanies in Latter-day Saint Canon”, Studies in the Bible and Antiquity 3 (2011): pp. 58–64. Ver também Neal Rappleye, “‘Put Away Childish Things’: Learn to Read the Book of Mormon with Mature Historical Understanding”, 2017 apresentação na Conferência FairMormon, pp. 32–33. 10. Tolley, "Alma 36", p. 308. 11. Ver Tolley, "Alma 36", pp. 308, 320 n.54. Para obter uma lista das 18 expressões encontradas tanto em Mosias 27 quanto em Alma 36, consulte John W. Welch, “Shared Words in the Three Accounts of Alma’s Conversion”, em Charting the Book of Mormon (Provo: FARMS, 1999), gráfico 107. 12. Consulte o artigo da Central do Livro de Mórmon, “Por que os nefitas mantinham alguns itens como 'tesouros nacionais'? (Mosias 1:16)”, KnoWhy 557 (16 de abril de 2020). Ver também Tolley, "Alma 36", p. 308; Spencer, An Other Testament, 3. 13. Tolley, "Alma 36", p. 308.

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