KnoWhy #575 | Agosto 27, 2020
Por que os capítulos 7 e 8 de Helamã parecem um discurso fúnebre?
Postagem contribuída por
Scripture Central
"E por causa de meus clamores e lamentos vos haveis reunido e estais admirados; sim, tendes muito de que ficar admirados." Helamã 7:15
O conhecimento
Quando Néfi, filho de Helamã, voltou de sua missão nas terras do norte, ficou desanimado com a "terrível" e "grande iniquidade" em que o povo estava envolvido (Helamã 7:4,6). O povo se tornara corrupto. Os justos foram condenados pelos ímpios simplesmente devido à sua retidão, enquanto os ímpios e culpados usaram seu poder financeiro para escapar da punição por seus crimes. Durante o mesmo período, os ladrões de Gadiânton subiram ao poder em cargos governamentais (Helamã 7:4-5). De fato, a sociedade justa que Néfi havia conhecido, estava morta. Portanto, como John W. Welch propôs, parece que Néfi pode ter decidido fazer um funeral.1
Néfi, que era o sumo sacerdote de Zaraenla, bisneto direto de Alma, o filho, escalou a torre de seu jardim — possivelmente uma estrutura piramidal ou montículo, onde seus próprios ancestrais estavam enterrados — perto da estrada real, e começou seu lamento: "Oh! Se eu tivesse vivido nos dias em que meu pai Néfi saiu da terra de Jerusalém" (Helamã 7:7). O fato de Néfi ter sofrido "grande lamentação" atraiu tanta atenção das pessoas que passavam por ali, que provavelmente fora a razão de Néfi ter escolhido aquele local2, e rapidamente uma multidão se reuniu "admirados" pela cena (Helamã 7:11,15).
A lamentação de Néfi deve ter envolvido algumas ações dramáticas para causar tamanha agitação. Welch sugeriu que "Néfi pode ter atraído a atenção para sua mensagem ao agir como se alguém tivesse acabado de morrer. [...] Pode-se imaginar Néfi vestido com o tradicional traje de luto nefita (seja lá qual for), possivelmente gesticulando no topo de sua torre, talvez em moções de luto. Os espectadores teriam se perguntado imediatamente quem, na importante família aristocrática dos descendentes do grande Alma, havia acabado de falecer".3
Embora possa parecer um comportamento excêntrico pelos padrões de hoje, tais ações simbólicas eram um método comum usado pelos antigos profetas hebreus para transmitir uma mensagem.4 Por exemplo, Jeremias usava um jugo enquanto profetizava que o povo de Jerusalém cairia na escravidão servindo a Babilônia (Jeremias 27:2-11). Jeremias também realizou outros atos simbólicos, como esconder um cinto de linho (Jeremias 13:1-11) e quebrar uma botija (Jeremias 19:1-13).5
O estudioso hebraico Donald W. Parry explicou que "atos dramáticos capturam a atenção da audiência dos profetas, apelando para que os ouçam e vejam. Eles são vívidos e tridimensionais. Além disso, a ação encenada pode ser muito mais impactante do que a palavra falada".6 Como Welch observou, "Se durante esse tempo Néfi estivesse simulando luto ou uma cerimônia fúnebre, teria sido extremamente curioso."7
O porquê
Se Néfi realmente encenou um serviço fúnebre, como seus dramáticos atos de lamentação podem ter ajudado a realçar sua mensagem? Primeiro, Néfi certamente chamou a atenção das pessoas no centro da cidade de Zaraenla. Seu comportamento era incomum. Como todo bom orador faz, Néfi primeiro teve que conseguir que as pessoas parassem o que estavam fazendo e o ouvissem. Os profetas fazem isso regularmente, para darmos ouvidos a palavra do Senhor, a qual eles foram encarregados de transmitir. Claramente, como disse Welch, um luto encenado "acrescenta uma possibilidade rica e interessante do significado simbólico a este texto".8
Por exemplo: ''Se a torre de Néfi [por acaso fosse] o local de sepultamento de sua família [como essas torres costumavam ser], sua referência à retidão de seus ancestrais em seu funeral alegórico à nação nefita, teria sido ainda mais comovente".9 Quando as pessoas se perguntavam quem havia morrido, seriam repentinamente surpreendidas quando Néfi se voltasse contra elas e as condenasse por suas iniquidades, ao perguntar "Por que desejais morrer?", em vez de se arrepender (Helamã 7:13-17). Néfi mais tarde prediz sobre o massacre, morte e destruição do povo nas mãos de seus inimigos (Helamã 7:22,24,28).10
É possível que Néfi também tenha agido e falado dessa maneira para aumentar sua alusão aos vários precedentes históricos de pessoas sendo libertas da morte. Ele recorreu a modelos tipológicos, como o dos israelitas quando foram libertos no Mar Vermelho, e quando olharam para a serpente de bronze no deserto (Helamã 8:11-19). Como disse Welch: "Os temas da morte e libertação da morte caracterizam as palavras de Néfi ao longo deste discurso".11 Portanto, ao encenar um funeral, Néfi reforçaria as consequências de não buscar e receber libertação do Senhor.
Por fim, Néfi concluiu sua declaração pública, respondendo à pergunta que pairava na mente de todos ("quem morreu?") com o anúncio profético de que o juiz supremo havia morrido (Helamã 8:27). Assim, como Welch observou: ''Para uma pessoa específica'', no caso, o juiz supremo, ''o funeral de Néfi foi mais do que mera alegoria''. A veracidade das palavras de Néfi logo fora confirmada, exortando todos a ouvir atentamente a voz do santo profeta. Como Welch concluiu, a "morte do juiz supremo não só teria validado as palavras de Néfi, em geral", mas também apresentaria um cadáver real, "representando todo o povo de Zaraenla", completando assim, de forma poderosa, a urgente mensagem profética desse aparente sermão fúnebre.12
Leitura Complementar
John W. Welch, ''Was Helaman 7–8 An Allegorical Funeral Sermon?'' em Reexploring the Book of Mormon: A Decade of New Research, ed. John W. Welch (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1992), pp. 239–241. Donald W. Parry, ''Symbolic Action as Prophetic Curse'', em Reexploring the Book of Mormon, pp. 206–208. Donald W. Parry, Preserved in Translation: Hebrew and other Ancient Literary Forms in the Book of Mormon (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e BYU Religious Studies Center, 2020), pp. 75–80.1. John W. Welch, ''Was Helaman 7–8 An Allegorical Funeral Sermon?'' em Reexploring the Book of Mormon: A Decade of New Research, ed. John W. Welch (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1992), pp. 239–241.
2. Consulte o artigo da Central do Livro de Mórmon, ''Por que Néfi profetizou perto da ''estrada que conduzia ao mercado''? (Helamã 7:10)'', KnoWhy 178 (8 de agosto de 2017). 3. Welch, ''Allegorical Funeral Sermon'', p. 240. 4. Ver Donald W. Parry, ''Symbolic Action as Prophetic Curse'', em Reexploring the Book of Mormon, pp. 206–208; Donald W. Parry, Preserved in Translation: Hebrew and other Ancient Literary Forms in the Book of Mormon (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e BYU Religious Studies Center, 2020), pp. 75–80. 5. Ver Welch, ''Allegorical Funeral Sermon'', p. 239. Outros exemplos citados por Welch, podem ser encontrados em 1 Reis 11:29–39; 2 Reis 13:15-19; Isaías 20:2–6. Para uma tabela detalhada de vários outros exemplos, veja Parry, Preserved in Translation, pp. 76–78. 6. Parry, Preserved in Translation, p. 79. 7. Welch, ''Allegorical Funeral Sermon'', p. 240. 8. Welch, ''Allegorical Funeral Sermon'', p. 241. 9. Welch, ''Allegorical Funeral Sermon'', p. 240. Na Mesoamérica, as estruturas piramidais familiares são consideradas santuários ancestrais. Ver Leah McCurdy, Whitney Lytle e M. Kathryn Brown, ''New Investigations of Xunantunich’s Site Core'', em Archaeological Investigations in the Eastern Maya Lowlands: Papers of the 2013 Belize Archaeology Symposium, ed. John Morris, Jaime Awe, Melissa Badillo e George Thompson (Belmopan, Belize: Institute of Archaeoloy, 2014), p. 217. 10. Welch, ''Allegorical Funeral Sermon'', pp. 240–241. 11. Welch, ''Allegorical Funeral Sermon'', p. 241. 12. Welch, ''Allegorical Funeral Sermon'', p. 241.