KnoWhy #490 | Agosto 21, 2019

O Livro de Mórmon realmente tinha uma gramática ''ruim''?

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Scripture Central

''Portanto, quando escrevemos, observamos nossa fraqueza e tropeçamos por causa da colocação de nossas palavras; e eu temo que os gentios zombem de nossas palavras''.

O conhecimento

O profeta Morôni estava preocupado com a escrita do Livro de Mórmon. Ele explicou que ''quando escrevemos, observamos nossa fraqueza e tropeçamos por causa da colocação de nossas palavras'' (Éter 12:25). Por esta razão, ele estava preocupado de que "os gentios zomb[assem] de [suas] palavras" (v. 23). Pouco depois do Livro de Mórmon sair da gráfica em 1830, o medo de Morôni se tornou realidade. Alexander Campbell, um dos primeiros e mais influentes críticos do Livro de Mórmon, afirmou ser "sem exagero, o pior livro na língua inglesa". Mais tarde, ele afirmou que, além das citações da Bíblia, o livro não tinha nem mesmo ''uma única boa oração''.1 Embora Campbell tenha sido muito negativo em sua avaliação da escrita do Livro de Mórmon, é compreensível que ele e outros sentiram que a língua original soava um pouco estranha. Isso porque era realmente estranha, mesmo na década de 1830. O próprio Joseph Smith parece ter pensado assim porque, enquanto se preparava para a republicação do Livro de Mórmon em 1837,2 corrigiu muitas das palavras e frases não padronizadas.3 Por muitos anos, crentes e críticos assumiram que a gramática incomum do Livro de Mórmon era simplesmente um produto do dialeto rural de Joseph Smith ou que pode ser o resultado de um orador sem instrução tentando soar bíblico. No entanto, em uma reviravolta surpreendente, pesquisas linguísticas recentes mostraram que quase todas essas palavras ou frases não padronizadas no Livro de Mórmon estão conforme o uso aceitável de um período anterior da língua inglesa, chamado inglês moderno inicial.4 Por exemplo, Campbell aparentemente discordou da frase ''had porke'' — a qual é um morfema antigo e não o que se usa hoje, "had spoken'', do verbo ''to speak" — em 2 Néfi 4:14: ''For I had porke many things unto them", que significa ''porque lhes tinha falado muitas coisas''.5 A maioria dos falantes de inglês hoje acharia que "had porke" é um erro gramatical e deve ser substituído por "had spoken". No entanto, dizer "had porke" estava correto no início do inglês moderno, como visto em um texto de 1614: "[…] if he had porke of the power of Anti-Christ" (se ele tivesse falado do poder do anticristo)6 Campbell também achou problemática a redação de Alma 31:36, que afirma em inglês que Alma "clapped his hands upon all they which were with him" (impôs as mãos sobre todos os que estavam com ele).7 Atualmente, o inglês padrão não permite que o uso de um pronome subjetivo como “they” seja usado como um objeto em uma frase. Seria de se esperar que dissesse em inglês "upon all them who were with him" (não há equivalente em português). No entanto, mais uma vez, o uso do inglês moderno inicial do Livro de Mórmon está bem estabelecido. Um texto inglês de 1489, por exemplo, afirma que um homem "made all they that were with him […] to be hanged" (fez com que todos os que estavam com ele […] fossem enforcados).8 Dezenas de exemplos semelhantes podem ser citados.9 Além disso, muitas das palavras do Livro de Mórmon em inglês e grande parte de sua sintaxe (como as palavras são organizadas) são do mesmo período moderno inicial. Embora algumas de suas características arcaicas possam ser realmente encontradas na Bíblia, outras foram usadas pela última vez em textos escritos muito antes dos dias de Joseph Smith — às vezes, alguns séculos antes.10 [caption id="attachment_2143" align="aligncenter" width= "500Escrituras, por Grant Heaton. Imagem via Biblioteca de Mídia do Evangelho. "] "Escrituras", por Grant Heaton. Imagem via Biblioteca de Mídia do Evangelho.

O porquê

Seja qual for a fonte da linguagem arcaica do Livro de Mórmon, deve ser óbvio que a ideia de gramática "ruim" é um conceito relativo. Todas as línguas evoluem naturalmente ao longo do tempo e, portanto, as regras sobre o que se qualifica como uso correto e errado estão sempre mudando. Enquanto frases como "had porke" (tinha falado) e "upon all they wich were with him" (sobre todos os que estavam com ele) pode soar ruim para os leitores ingleses modernos que sabem a gramática correta, seriam perfeitamente aceitas pelos padrões ingleses anteriores. Felizmente, os primeiros membros de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias não estavam tão preocupados com a gramática do Livro de Mórmon. O que os preocupava era a mensagem sobre Cristo que estava por trás de sua linguagem e o poder espiritual que acompanhava a mensagem.11 Sua recepção favorável, apesar daqueles que zombariam das palavras do Livro de Mórmon, é exatamente o que o Senhor profetizou que aconteceria.12 O Senhor declarou a Morôni: ''Os tolos zombam, mas lamentarão; e não se aproveitarão de vossa debilidade, porque minha graça basta aos mansos'' (Éter 12:26). O Senhor explicou mais tarde que se as pessoas ''se humilhem perante mim e tenham fé em mim, então farei com que as coisas fracas se tornem fortes para eles'' (Éter 12:27). De certa forma, essa situação aconteceu com a linguagem do Livro de Mórmon. Por muitos anos, foi menosprezada como tendo uma gramática defeituosa. Agora, com a ajuda de bancos de dados modernos e motores de busca, as mesmas coisas que eram vistas como um inglês “ruim” estão se tornando um inglês surpreendentemente “bom” — apenas de um tempo diferente do esperado e não o de Joseph Smith. Esta situação pode auxiliar os leitores a verem por que é importante ignorar aqueles que zombam e perseguem o que é bom e santo. O profeta Isaías disse: ''Ai dos que ao mal chamam bem, e ao bem, mal; que fazem das trevas luz, e da luz, trevas; e fazem do amargo doce, e do doce, amargo!'' (Isaías 5:20). Quando humilharmos nosso coração e pedirmos ajuda ao Senhor para ver as verdades espirituais, conseguiremos discernir o que é bom,13 mesmo que aqueles que confiam apenas em uma perspectiva gramatical não possam vê-lo.14

Leitura Complementar

Royal Skousen e Stanford Carmack, The History of the Text of the Book of Mormon, Part Three: The Nature of the Original Language (Provo, UT: FARMS, 2018). Stanford Carmack, "Is the Book of Mormon a Pseudo-Archaic Text?", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 28 (2018): pp. 177–232. e Stanford Carmack, "Editing Out the 'Bad Grammar' in the Book of Mormon", The Interpreter Foundation, 2016 Stanford Carmack, "Exploding the Myth of Unruly Book of Mormon Grammar: A Look at the Excellent Match with Early Modern English", The Interpreter Foundation/BYU Studies, 2015. Stanford Carmack, "A Look at Some 'Nonstandard' Book of Mormon Grammar", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 11 (2014): pp. 209–262.

1. Alexander Campbell, Delusions (Boston, MA: Waitt and Dow’s Press, 1832), p. 15. 2. Para o texto da edição de 1837, consulte "Book of Mormon, 1837", The Joseph Smith Papers, acessado em 24 de outubro de 2018, disponível em josephsmithpapers.org. 3. Para saber mais sobre as várias edições do Livro de Mórmon, ver Royal Skousen, Analysis of Textual Variants of the Book of Mormon, Volume 4 do Texto Crítico do Livro de Mórmon, (Provo, UT: FARMS, 2014); Royal Skousen, ''Conjectural Emendation in the Book of Mormon", FARMS Review 18, no. 1 (2006): pp. 187–231; Royal Skousen, "Book of Mormon Editions (1830–1981)", The Encyclopedia of Mormonism, 4 v., ed. Daniel H. Ludlow (New York, NY: Macmillan, 1992), 1: pp. 175–176; George Horton, ''Understanding Textual Changes in the Book of Mormon'', Ensign, dezembro de 1983, disponível em lds.org. 4. Ver Royal Skousen e Stanford Carmack, The History of the Text of the Book of Mormon, Part Three: The Nature of the Original Language (Provo, UT: FARMS, 2018), p. 621. 5. Ver Campbell, Delusions, p. 14. Para a edição de 1830 do Livro de Mórmon, consulte ''Book of Mormon, 1830'', p. 69, The Joseph Smith Papers, acessado em 23 de outubro de 2018, disponível em josephsmithpapers.org. 6. Skousen e Carmack, The History of the Text of the Book of Mormon, p. 632. 7. Campbell, Delusions, p. 14. Ver também, ''Book of Mormon, 1830'', p. 313, The Joseph Smith Papers, acessado em 24 de outubro de 2018, disponível em josephsmithpapers.org. 8. Skousen e Carmack, The History of the Text of the Book of Mormon, pp. 637, 655. 9. Ver Skousen e Carmack, The History of the Text of the Book of Mormon, pp. 621–658. 10. Para saber mais sobre o léxico, a sintaxe e as características gramaticais arcaicas do Livro de Mórmon, consulte Skousen e Carmack, The History of the Text of the Book of Mormon; Stanford Carmack, "Is the Book of Mormon a Pseudo-Archaic Text?" Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 28 (2018): pp. 177-232; Stanford Carmack, "Barlow on Book of Mormon Language: An Examination of Some Strained Grammar" Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 27 (2017): pp. 185–196; Stanford Carmack, "How Joseph Smith's Grammar Differed from Book of Mormon Grammar: Evidence from the 1832 History" Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 25 (2017): pp. 239–259; Royal Skousen e Stanford Carmack, "Editing Out the 'Bad Grammar' in the Book of Mormon", The Interpreter Foundation, 2016; Stanford Carmack, "The Case of the {-th} Plural in the Earliest Text", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 18 (2016): pp. 79–108; Stanford Carmack, "The Case of Plural Was in the Earliest Text", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 18 (2016): pp. 109–137; Stanford Carmack, "Joseph Smith Read the Words", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 18 (2016): pp. 41–61; Stanford Carmack, "The More Part of the Book of Mormon is Early Modern English", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 18 (2016): pp. 33–40; Stanford Carmack, "Exploding the Myth of Unruly Book of Mormon Gram: A Look no Excellent Match with Early Modern English", The Interpreter Foundation/BYU Studies, 2015; Royal Skousen, "'A theory! A theory! We have already got a theory, and there cannot be any more theories!'" The Interpreter Foundation/BYU Studies, 2015; Stanford Carmack, "Why the Oxford English Dictionary (and not Webster’s 1828)", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 15 (2015): pp. 65–77; Stanford Carmack, "The Implications of Past-Tense Syntax in the Book of Mormon", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 14 (2015): pp. 119–186; Stanford Carmack, "What Command Syntax Tells Us About Book of Mormon Authorship", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 13 (2015): pp. 175–217; Stanford Carmack, "A Look at Some 'Nonstandard' Book of Mormon Grammar", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 11 (2014): pp. 209–262. 11. Ver o artigo da Central do Livro de Mórmon, ''Por que o Livro de Mórmon é tão focado em Jesus Cristo?(2 Néfi 25:26)'', KnoWhy 484. 12. Consulte o artigo da Central do Livro de Mórmon, ''Qual Papel o Livro de Mórmon Desempenha no Trabalho Missionário? (2 Néfi 30:3)", KnoWhy 288, (11 de janeiro de 2018). 13. Ver Morôni 10:6: "E tudo o que é bom, é justo e verdadeiro; portanto, nada que é bom nega o Cristo, mas reconhece que ele é''. 14. Ver Quentin L. Cook, ''Quando ao mal chamam bem e ao bem, mal'', Liahona, março de 2018, disponível em lds.org; pronunciado em um devocional, ''A Banquet of Consequences: The Cumulative Result of All Choices'', ministrado na Brigham Young University, 7 de fevereiro de 2017, disponível em speeches.byu.edu.