KnoWhy #678 | Junho 7, 2023

O que Jesus poderia ter ensinado a seus apóstolos durante quarenta dias?

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Scripture Central

"Aos quais também, depois de ter padecido, se apresentou vivo, com muitas e infalíveis provas, sendo visto por eles pelo espaço de quarenta dias, e falando do que diz respeito ao reino de Deus." Atos 1:3

O conhecimento

No início do livro de Atos, Lucas menciona a maneira pela qual Jesus Cristo "se apresentou vivo, com muitas e infalíveis provas," aos seus onze apóstolos restantes, "sendo visto por eles pelo espaço de quarenta dias, e falando do que diz respeito ao reino de Deus" (Atos 1:3). Entretanto, a conclusão do Evangelho de Lucas limita as aparições de Jesus após sua ressurreição a apenas um dia (ver Lucas 24:13, 34, 36) e João 21 menciona apenas um breve encontro. Devido à breve referência ao ministério de quarenta dias em Atos 1, os leitores da Bíblia se perguntam o que foi ensinado naqueles dias.

Hugh Nibley, um estudioso da Igreja, foi um dos primeiros a investigar seriamente esse extenso período de instrução, expandido nos textos apócrifos escritos pelos primeiros cristãos. Muitos desses escritos, observa Nibley, tornaram-se um grande desconforto para a Igreja Cristã à medida que ela avançava ao século IV. "A grande literatura da missão de quarenta dias do Senhor", explica Nibley, "foi rapidamente perdida de vista pelo mundo cristão porque nunca foi muito popular", e os primeiros escritores desde "Clemente e Orígenes empregaram toda a retórica e lógica para evitar [o] literalismo bruto" de Atos 1:3. 1O que poderia ter levado a esse desconforto em relação às menções do ministério de quarenta dias de Jesus? Em todos os textos que Hugh Nibley estudou, surgiram quatro temas relacionados a essa ministração que, naturalmente, teriam levado esses textos a serem tão impopulares entre muitos dos primeiros cristãos.

1. Profecias de Apostasia

Primeiramente, muitos desses textos afirmam que os apóstolos "serão rejeitados por todos os homens e dolorosamente se retirarão do mundo, momento em que corruptores e falsos pastores aparecerão dentro da Igreja, onde uma crescente facção de mundanos logo vencerá e eliminará o que resta dos santos fiéis".2 Esta imagem sombria de uma apostasia iminente acaba sendo "confirmada pelos Padres Apostólicos, que estão convencidos de que contemplam o cumprimento dessas mesmas profecias" no início do século II d.C., ao se basearem nos escritos anteriores do Novo Testamento, que advertiam os apóstolos de que "lobos cruéis, que não pouparão o rebanho" (Atos 20:29). 3 Visto que Jesus havia advertido seus apóstolos sobre uma apostasia durante Seu ministério mortal4, seria de se esperar que um ensinamento tão importante fosse reforçado durante esse momento crítico, antes dos apóstolos viajarem ao exterior para compartilhar a mensagem do Evangelho. Das várias viagens de cada apóstolo surgiriam experiências que se tornariam a base de temas comuns nos primeiros escritos cristãos, oferecendo relatos apócrifos de como os apóstolos cumpriram sua missão seguindo as instruções de quarenta dias do Senhor, por meio de milagres e ensinamentos secretos. 5

2. Realização das Sagradas Ordenanças

Em segundo lugar, os ensinamentos contidos na literatura de quarenta dias são descritos como sendo transmitidos a um "grupo de culto fechado". Isso incluía a realização de vários ritos e ordenanças do Sacerdócio como "cerimônias de lavagem e unção", seguidos do recebimento de uma "vestimenta simbólica, mas real e tangível". Outros textos enfocam a natureza do casamento, uma das ordenanças mais sagradas a serem mantidas em segredo.6 S. Kent Brown e C. Wilfred Griggs também apontam que alguns desses textos (como o Evangelho de Filipe) colocam o casamento como "um requisito para aqueles que alcançariam o mais alto dos três céus".7 Outras ordenanças encontradas nesses textos incluem um círculo de oração, bem como um relato ritual do Conselho Pré-Mortal no Céu, a queda de Lúcifer, a Criação e a Queda e, finalmente, o recebimento de convênios preparatórias para o retorno do Senhor.8 Aqueles que forem fiéis a esses convênios, John Gee aponta, têm a promessa de poder "voltar à glória de Deus". Além disso, "esses relatos, geralmente chamados de secretos […] estão frequentemente relacionados ao templo de alguma forma, ou são comparados ao Monte da Transfiguração"9, outra experiência do Templo, registrada no Novo Testamento.10 Essas ordenanças foram observadas nos primeiros anos do cristianismo, mas acabaram sendo perdidas e corrompidas por grupos opositores. No entanto, Nibley observa que todas essas ordenanças "se voltam para o Templo e pertencem à instrução feita nos 40 dias". 11

3. Salvação para os mortos

Terceiro, Jesus Cristo ensinou seus apóstolos sobre Sua descida ao reino dos mortos. Nesses textos, isso costuma ser chamado de kerygma, ou "pregação". Tais textos retratam Jesus não apenas guiando os santos justos para seu lar celestial, como também organizando o trabalho para aqueles que não puderam aceitar o Evangelho nesta vida. Jesus declarou nessa pregação que até mesmo esses espíritos precisariam de um selo de batismo e de outras ordenanças, que seriam realizadas em favor dos mortos. 12 Somente depois que essas ordenanças fossem realizadas e aceitas por cada espírito individualmente, eles teriam permissão para "seguir [Jesus] das trevas para o Seu reino". 13

4. Ressurreição dos mortos

Quarto, Jesus ensinou sobre a ressurreição dos mortos, incluindo Sua própria ressurreição, que permitiu que Ele continuasse a ministrar a Seus apóstolos em "uma série de aparições reais, dando continuidade à tutela pessoal e à supervisão nos 40 dias". Entretanto, as visitas de Jesus aos Seus santos justos não seriam feitas apenas aos Seus apóstolos; de acordo com esses textos, Ele faria "outras aparições, especialmente para algumas 'almas justas, puras e fiéis', para prepará-las para a última e gloriosa" Segunda Vinda.14

O porquê

Embora os relatos apócrifos que cercam o ministério de quarenta dias de Jesus Cristo não sejam aceitos nem usados como Escritura, parecem conter vários ensinamentos que coincidem com as verdades restauradas do Evangelho - sugerindo que podem ter perfeitamente preservado ensinamentos autênticos do Senhor ressuscitado. Como tal, as instruções que o Senhor deu sobre os apócrifos em Doutrina e Convênios 91 poderiam legitimamente também se estender a esses escritos:

Há muitas coisas neles que são verdadeiras e estão, na maior parte, traduzidas corretamente. Há muitas coisas neles que não são verdadeiras, que são acréscimos feitos pelas mãos de homens. [...] Portanto, aquele que os ler que compreenda, pois o Espírito manifesta a verdade; E aquele que for iluminado pelo Espírito se beneficiará com eles".15.

Muitos dos ensinamentos citados acima têm paralelos perfeitos com as escrituras da Restauração, incluindo passagens do Livro de Mórmon, Doutrina e Convênios e a Pérola de Grande Valor. Por exemplo, Hugh Nibley descobriu que esses quatro temas-chave proeminentes na literatura de quarenta dias são igualmente paralelos ao ministério pós-ressurreição de Cristo, conforme registrado em 3 Néfi 11-28.

Um relato apócrifo conhecido como o Evangelho dos Doze Apóstolos, descoberto em 1904, espelha o relato de 3 Néfi em grande detalhe. Algumas dessas semelhanças incluem o Senhor comer uma refeição sagrada com Seus discípulos e compartilhar versões das Orações Sacramentais, ordenar que Seus discípulos sejam um com Ele e expressar o desejo de que Seus discípulos busquem dons mais elevados e incentivá-los em sua busca por dons sagrados.16 Essas semelhanças levaram Hugh Nibley a concluir que esses escritos "pertencem ao estrato mais antigo da escrita cristã".17 Assim como os autores da literatura de quarenta dias, os santos dos últimos dias também valorizam as ordenanças sagradas realizadas nos templos. O casamento, uma das ordenanças destacadas nesses escritos, é visto como uma ordenança sagrada e eterna no Evangelho Restaurado e necessária para nossa admissão ao mais alto grau de glória celestial (ver D&C 131:1-4; 132).

Outras ordenanças realizadas em favor de nossos antepassados que já faleceram são encontradas na Restauração, Assim como relatos do Conselho Pré-Mortal no Céu, a Criação, a Queda e o recebimento de convênios sagrados para trazer Adão e Eva de volta à presença do Senhor, como os encontrados na literatura dos quarenta dias.18 Esses temas são especialmente proeminentes no Templo, onde aprendemos mais sobre a Expiação de Jesus Cristo por meio dos convênios feitos lá. Por fim, o ministério pós-mortal de Jesus Cristo no mundo espiritual, bem como Suas aparições aos Seus profetas escolhidos como um ser glorioso e ressuscitado, são considerados pelos profetas modernos como fatos muito reais.19Embora os ensinamentos e ordenanças descritos nesses textos tenham sido perdidos ou corrompidos na Igreja antiga, eles foram restaurados por meio de um profeta vivo. Apesar de muitos aspectos desses textos serem interpretações e acréscimos posteriores, podem esclarecer essas importantes verdades do Evangelho, conforme foram ensinadas e compreendidas pela Igreja Cristã primitiva. Eles também podem ajudar a aprofundar nosso apreço pela Restauração do Evangelho e suas ordenanças, que foram realmente restauradas para nosso benefício nos últimos dias.

Leitura Complementar

Hugh Nibley, "Evangelium Quadraginta Dierum: The Forty-Day Mission of Christ-The Forgotten Heritage," em Mormonism and Early Christianity (Provo, UT: Foundation for Ancient Research and Mormon Studies [FARMS]; Salt Lake City, UT: Deseret Book, 1987), pp. 10–44, primeira publicação em Vigilae Christianae 20 (1966): pp. 1–24. Hugh Nibley, Teachings of the Book of Mormon, Semester 4: Transcripts of Lectures Presented to an Honors Book of Mormon Class at Brigham Young University, 1988–1990 (Provo, UT: FARMS; American Fork, UT: Covenant Communications, 2004), pp. 69–80, 115–126. Hugh Nibley, "Christ Among the Ruins," em The Prophetic Book of Mormon (Provo, UT: FARMS; Salt Lake City, UT: Deseret Book, 1989), pp. 407–434. John Gee, "Jesus Christ: Forty-Day Ministry and Other Post-Resurrection Appearances of Jesus Christ," em Encyclopedia of Mormonism, 4 v., ed. Daniel H. Ludlow (New York, NY: Macmillan, 1992), 2: pp. 734–736. S. Kent Brown e C. Wilfred Griggs, "The Postresurrection Ministry", em Studies in Scripture: Acts to Revelation, v. 6 de 8, ed. Robert L. Millet (Salt Lake City, UT: Deseret Book, 1987), pp. 12–23.

1. Hugh Nibley, "Christ among the Ruins", em The Prophetic Book of Mormon (Provo, UT: Foundation for Ancienct Research and Mormon Studies [FARMS]; Salt Lake City, UT: Deseret Book, 1989), p. 409; Hugh Nibley, "Evangelium Quadraginta Dierum: The Forty-Day Mission of Christ-The Forgotten Heritage", em Mormonism and Early Christianity (Provo, UT: FARMS; Salt Lake City, UT: Deseret Book, 1987), p. 10. 2. Nibley, "Evangelium Quadraginta Dierum", p. 13. S. Kent Brown e C. Wilfred Griggs, "The Postresurrection Ministry", em Studies in Scripture: Acts to Revelation, v. 6 de 8, ed. Robert L. Millet (Salt Lake City, UT: Deseret Book, 1987), 21–22; John Gee, "Jesus Christ: Forty-Day Ministry and Other Post-Resurrection Appearances of Jesus Christ", em Encyclopedia of Mormonism, 4 v., ed. Daniel H. Ludlow (New York, NY: Macmillan, 1992), 2: p. 735. 3. Nibley, "Evangelium Quadraginta Dierum", pp. 13–14. Para obter uma lista de todas as escrituras do Novo Testamento que profetizam a apostasia na Igreja primitiva, consulte Noel B. Reynolds, "New Testament Evidences and Prophecies of Apostasy in the First-Century Church," em Early Christians in Disarray: Contemporary LDS Perspectives on the Christian Apostasy, ed. Noel B. Reynolds (Provo, UT: FARMS, 2005), pp. 355–370. 4. Ver, por exemplo, Mateus 7:15; 13:24–30; e 24:5, 24. Ver também o artigo da Central do Livro de Mórmon, "O que a parábola do trigo e do joio ensina sobre a apostasia? (Mateus 13:24–25)", KnoWhy 660 (3 de março de 2023); Reynolds, "New Testament Evidences", p. 358 5. Ver Brown e Griggs, "The Postresurrection Ministry", pp. 16–19. Alguns dos textos que ele cita incluem Atos de André, Atos de João, Atos de Pedro, Atos de Filipe e Atos de Tomé. Todos esses textos compartilham o tema comum de detalhar a jornada missionária de um apóstolo com uma referência explícita ou implícita aos ensinamentos secretos que receberam durante o ministério de quarenta dias de Jesus. 6. Nibley, "Evangelium Quadraginta Dierum", pp. 14, 17. Ver também Brown e Griggs, "The Postresurrection Ministry", pp. 20–21. 7. Brown e Griggs, "The Postresurrection Ministry", p. 21. Para obter mais informações sobre os temas do Templo no Evangelho de Filipe, ver Gay Strathearn, "Reading the Gospel of Philip as a Temple Text", em By Our Rites of Worship: Latter-day Saint Views on Ritual in Scripture, History, and Practice, ed. Daniel L. Belnap (Provo, UT: Religious Studies Center, Brigham Young University; Salt Lake City, UT: Deseret Book, 2013), pp. 173–205. 8. Nibley, "Evangelium Quadraginta Dierum", pp. 16–17. Ver também Brown e Griggs, "The Postresurrection Ministry," pp. 19–20; Gee, "Jesus Christ: Forty-Day Ministry," 2: p. 735. 9. Gee, "Jesus Christ: Forty-Day Ministry", 2: p. 735. 10. Por exemplo, Heber C. Kimball ensinou certa vez que "Jesus conduziu Pedro, Tiago e João a uma alta montanha, e ali deu-lhes a investidura [do Templo] e colocou sobre eles a autoridade para liderar a Igreja de Deus em todo o mundo, ordenar homens ao Sacerdócio, colocar a Igreja em ordem e enviar os élderes de Israel para pregar a um mundo que perece". Heber C. Kimball, "Proclamation of the Gospel to the Dead," em Journal of Discourses, 26 v. (London, UK: Latter-day Saints' Book Depot, 1854–1886), 9: p. 327. De acordo com Doutrina e Convênios 63:21, Pedro, Tiago e João também viram o futuro glorioso da Terra, "cuja plenitude ainda não recebestes". Para uma análise completa deste evento, ver Rebecca L. Sybrowsky, "The Mount of Transfiguration," Studia Antiqua 2, no. 2 (2003): pp. 55–86. 11. Nibley, "Evangelium Quadraginta Dierum", p. 17. 12. Ver Nibley, "Evangelium Quadraginta Dierum", pp. 15–17; Nibley, "Christ Among the Ruins", pp. 412–413, 428–431; Gee, "Jesus Christ: Forty-Day Ministry", 2: p. 735. 13. Nibley, "Christ among the Ruins", p. 413. 14. Nibley, "Evangelium Quadraginta Dierum", pp. 17–18. 15. Doutrina e Convênios 91:1–2, 4–6. Ver também o artigo da Central do livro de Mórmon, "Por que estudar a antiga literatura apócrifa? (Doutrina e Convênios 91:1, 4–5)", KnoWhy 613 (12 de agosto de 2021).

16. Essa lista é derivada de uma comparação entre 3 Néfi e o Evangelho dos Doze Apóstolos que está em Nibley, "Christ among the Ruins", pp. 416–428. Para obter mais comparações entre 3 Néfi e os primeiros evangelhos cristãos (canônicos e não canônicos), consulte o artigo da Central do Livro de Mórmon, "Por que 3 Néfi às vezes é chamado de "Quinto Evangelho"? (3 Néfi 27:21)", KnoWhy 222 (12 de agosto de 2021); e Gee, "Jesus Christ: Forty-Day Ministry", 2: p. 736. 17. Nibley, "Christ among the Ruins", p. 416. O Evangelho dos Doze Apóstolos foi descoberto setenta e quatro anos após a publicação do Livro de Mórmon, o que impossibilita a Joseph Smith ter conhecido tal texto.

18. Compare os relatos dos livros de Moisés e Abraão, que oferecem uma visão adicional desses eventos sagrados da história.

19. Ver, por exemplo, Doutrina e Convênios 110; 128; 138; Joseph Smith-História 1:15–20.

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