KnoWhy #574 | Agosto 20, 2020

Por que Paorã, Paânqui e Pacumêni são nomes tão parecidos?

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Scripture Central

"Ora, estes são os nomes dos que disputaram a cadeira de juiz e que também causaram contendas entre o povo: Paorã, Paânqui e Pacumêni." Helamã 1:3

O conhecimento

Uma regra geral ao escrever histórias de ficção é que os autores devem escolher nomes acessíveis a seus leitores. "Os leitores devem conseguir pronunciá-los, diferenciá-los, lembrá-los e identificá-los"1 Para facilitar a leitura, os escritores de ficção costumam "tomar cuidado e evitar dois personagens principais cujos nomes comecem com o mesmo som".2 É claro que, na vida real, nem sempre é possível evitar que pessoas com nomes semelhantes (ou mesmo idênticos) convivam, e os padrões de nomenclatura históricos diferem daqueles encontrados na ficção.3 Portanto, não é surpreendente que o Livro de Mórmon, como um registro histórico antigo, frequentemente quebre esta regra, fundamental nas práticas modernas de nomenclatura fictícia.4

Por exemplo, no início do livro de Helamã, os leitores encontram um grupo confuso de três nomes com sonoridade parecida: dois homens (pai e filho) chamados Paorã, assim como os dois irmãos de Paorã, Paânqui e Pacumêni (Helamã 1:2-3). Embora esta constelação de nomes seja uma escolha improvável para um bom escritor de ficção, Hugh Nibley observou que soa verdadeiro para um registro escrito em "egípcio reformado" (Mórmon 9:32–34). "Uma coincidência impressionante", observou Nibley, "é a predominância do prefixo Pa- nos nomes de juízes egípcios e nefitas. No egípcio tardio, isso é extremamente comum".5 Cada nome, e não apenas o prefixo inicial Pa- (Egípcio pꜢ- = "o"/"a"), apresenta uma semelhança impressionante com os nomes egípcios.

Paorã (ou Parhoron/Pahoron).6

Correspondências administrativas egípcias/canaanitas escritas durante o século XIV a.C. frequentemente mencionam um oficial chamado Paḫura (também escrito como Piḫura, Piḫuru e Puḫuru), a representação cuneiforme do nome egípcio pꜢ-ḫr-ꜣn (Pa-ḫer-an, de acordo com Nibley) ou pꜢ-ḫꜣry.7 O nome significa "o sírio" ou "o hurrita".8 Portanto, sabemos que Paḫura era "um governador (rabu) Egípcio da Síria”.9

Paânqui

Nibley e outros pesquisadores relacionaram Paânqui ao nome egípcio pꜢ-ꜥnḫ (escrito Paiankh, Pianchi e Paankh, de acordo com Nibley, ou comumente Piankhou Pianq hoje em dia).10 Era o nome de um sumo sacerdote do deus Amon, que também foi general na Dinastia XXI (ca. 1069–945 a.C.),11 e talvez também fosse o nome de um importante faraó egípcio da Dinastia XXV (ca. 747-656 a.C.)12 Este nome é geralmente usado para designar "o vivente" e pode ser um título de divindade, como "o Deus vivo" (cf. Moisés 5:29).13 Visto que a palavra ankh(ꜥnḫ) significa principalmente “vida” ou “viver”, seu hieróglifo tornou-se um símbolo muito comum para a vida eterna. Além disso, ankh Também pode significar "juramento" ou "jurar". Assim, o linguista Matthew L. Bowen propôs alternativamente o significado "Ele [o deus] é meu juramento (de vida)" para pꜢ-ꜥnḫ-ỉ.14

Pacumêni

Nibley e outros compararam Pacumeni ao nome egípcio Pakamen (pꜢ-kmn), que significa "o cego".15 Nibley também sugeriu Pameneches (pꜢ-mnkh), que, às vezes, é escrito como Pachomios em grego.16 Kumen ou cumen também é um elemento comum em outros nomes do Livro de Mórmon,17 incluindo a cidade de Cumêni mencionada durante a grande guerra no Livro de Alma (Alma 56:14; 57:7–34). Acrescentando o egípcio pꜢ- a este nome para formar Pacumeni poderia significar "o cumenita", sugerindo a possibilidade de um vínculo com aquela cidade.18 Em hebraico, kmn significa “esconder; ocultar(-se)", portanto, outra possibilidade é "aquele que está escondido".19

O porquê

Reconhecer estes antecedentes reforça a credibilidade do Livro de Mórmon. A natureza egípcia desses nomes é tão convincente que até mesmo o eminente estudioso não-religioso do século XX, William F. Albright, ficou impressionado. Em uma carta, Albright expressou sua surpresa “por haver dois nomes egípcios, Paanch[i] y Pahor(an) [em inglês] ocorrendo simultaneamente no Livro de Mórmon, em uma estreita relação com uma referência ao idioma original 'egípcio reformado' ”.20

Além disso, esses três nomes egípcios são especialmente adequados para o cenário narrativo de Helamã 1:1–10. O caráter oficial desses nomes acrescenta um contexto adequado à história da morte dos filhos de Paorã, que havia sido o juiz supremo dos nefitas. Tamanha rivalidade familiar pela posição de sumo sacerdote é característica do sistema egípcio, no qual o ofício seria hereditário, não por lei, mas pelo costume".21

Nibley enfatizou um egípcio chamado Paânqui (Piankh), cujo pai (chamado Kherihor ou Ḥerihor [Egípcio: ḥry-ḥr], cf. Korihor) estava envolvido "em uma conspiração sacerdotal [que] o estabeleceu como rival do próprio Faraó, enquanto, seu filho Paânqui, de fato reivindicara o trono".22 Dessa maneira, o nome Pianj aparece em textos egípcios em estreita associação com uma tentativa de usurpar o trono, assim como Paânqui no Livro de Mórmon rejeita a voz do povo e tenta usurpar a cadeira de juiz (Helamã 1:5–8).

Mais recentemente, Matthew L. Bowen, um especialista em línguas semíticas e egípcias, enfatizou que a rebelião de Paânqui iniciou uma série de eventos que culminaram em seus seguidores fazendo pactos e combinações secretas, "jurando por seu eterno Criador" (Helamã 1:11). Assim, esta história envolvendo Paânqui (pꜢ-ꜥnḫ-ỉ) parece invocar ou aludir aos significados sutis de ankh (não só vida/viver, mas também juramento, jurar) e sua associação com juramentos e combinações sobre a vida de uma divindade.23

Embora a história da rivalidade pela cadeira de juiz, entre três irmãos de uma família política de elite, com nomes semelhantes (Paorã, Paânqui e Pacumêni) possa não ser uma boa história de ficcção, Mórmon aparentemente viu o valor desses nomes em vários níveis, assim os incluiu propositalmente em seu registro. Esses nomes e a história de Helamã 1 são presumivelmente mais próximos da realidade e consistentes com as antigas origens egípcias do Livro de Mórmon do que qualquer escritor de ficção em 1829 poderia esperar.

Leitura Complementar

Book of Mormon Onomasticon, s.v. PAHORAN, s.v. PAANCHI, s.v. PACUMENI.

Sharon Black e Brad Wilcox, “188 Unexplainable Names: Book of Mormon Names No Fiction Writer Would Choose,” Religious Educator 12, n. 2 (2011): pp. 118–133.

Matthew L. Bowen, “‘Swearing by Their Everlasting Maker’: Some Notes on Paanchi and Giddianhi,” Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 28 (2018): pp. 159–164.

Hugh Nibley, Lehi in the Desert/The World of the Jaredites/There Were Jaredites (Salt Lake City and Provo, UT: Deseret Book and FARMS, 1988), pp. 22–24.

Hugh Nibley, Approaching the Book of Mormon (Salt Lake City and Provo, UT: Deseret Book and FARMS, 1988), pp. 282–284.

1. Sharon Black and Brad Wilcox, “188 Unexplainable Names: Book of Mormon Names No Fiction Writer Would Choose,” Religious Educator 12, n. 2 (2011): p. 122. 2. Black and Wilcox, “188 Unexplainable Names,” p. 122. Ver também Sharon Black e Brad Wilcox, “Sense and Serendipity: Some Ways Fiction Writers Choose Character Names”, Names: A Journal of Onomastics 59, n. 3 (2011): pp. 152–163. 3. Brad Wilcox, Bruce L. Bowen, Wendy Baker-Smemoe, Sharon Black, e Justin Bray, “Identifying Authors by Phonoprints in Their Characters’ Names: An Exploratory Study,” Names: A Journal of Onomastics 61, n. 2 (2013): pp. 101–121. Este método é aplicado ao Livro de Mórmon em Brad Wilcox, Bruce L. Bowen, Wendy Baker-Smemoe, Sharon Black e Justin Bray “Comparing Book of Mormon Names with Those Found in J.R.R. Tolkien’s Works: An Exploratory Study,” Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 30 (2018): pp. 105–124; Brad Wilcox, Bruce L. Bowen, Wendy Baker-Smemoe, Sharon Black, and Justin Bray, “Comparing Phonemic Patterns in Book of Mormon Personal Names with Fictional and Authentic Sources: An Exploratory Study,” Interpreter: A Journal of Latter-day Saint Faith and Scholarship 33 (2019): pp. 105–122. 4. Ver Black and Wilcox, “188 Unexplainable Names,” pp. 122–123. 5. Hugh Nibley, Lehi in the Desert/The World of the Jaredites/There Were Jaredites (Salt Lake City and Provo, UT: Deseret Book and FARMS, 1988), p. 23. Veja também Hugh Nibley, Approaching the Book of Mormon (Salt Lake City and Provo, UT: Deseret Book and FARMS, 1988), p. 282. 6. Na parte existente do manuscrito original [em inglês], o nome Pahoran (Paorã) é escrito usando um 'o' como última vogal e, às vezes, com um 'r' antes do 'h' (ou seja, Pahoron ou Parhoron). Para uma análise das variações das grafias, consulte Royal Skousen, Analysis of Textual Variants of the Book of Mormon, 6 v., 2º. ed. (Provo, UT: FARMS e BYU Studies, 2017), 4: pp. 2737–2739. 7. Ver Nibley, Lehi in the Desert, 22, pp. 27–28; Nibley, Approaching, p. 284; Book of Mormon Onomasticon, s.v.PAHORAN. Veja EA 57, 117, 122, 123, 132, 189, 190, 207 e 208 em William L. Moran, editor e tradutor,  The Amarna Letters (Baltimore, MD: Johns Hopkins University Press, 1992); Anson F. Rainey, trans., The El-Amarna Correspondence: A New Edition of the Cuneiform Letters from the Site of El-Amarna based on Collations of all Extant Tablets, ed. William Schniedewind and Zipora Cochavi-Rainey (Boston, MA: Brill, 2015). Para a lista completa de variações ortográficas, veja Moran, p. 383. Observe que em alguns casos (por exemplo, EA 117, 132), Rainey usa Pawura ao invés de Paḫura. 8. Ver Moran, Amarna Letters, p. 383; cf. Leonard Lesko, A Dictionary of Late Egyptian, 2ª ed. (Providence, RI: B.C. Scribe Publications, 2002), 1: p. 349; Book of Mormon Onomasticon, s.v. PAHORAN, s.v. PACUMENI. Ver também Robert F. Smith, “Egyptianisms in the Book of Mormon” (n.p., no arquivo da Central das Escrituras), p. 38. 9. Nibley, Lehi in the Desert, p. 22. 10. Nibley, Lehi in the Desert, pp. 22–23, 27; Nibley, Approaching, pp. 283–284. T. Eric Peet, Egypt and the Old Testament (Liverpool and London: University Press of Liverpool and Hodder & Stoughton, 1922), 169 spells it Piankhi. Ver também Book of Mormon Onomasticon, s.v. PAANCHI; Matthew L. Bowen, “‘Swearing by Their Everlasting Maker’: Some Notes on Paanchi and Giddianhi,” Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 28 (2018): p. 159; Robert F. Smith “Some ‘Neologisms’ from the Mormon Canon,” 1973 Conference on the Language of the Mormons, May 31, 1973 (Provo: BYU Language Research Center, 1973), p. 65; Smith, “Egyptianisms,” p. 39. 11. Karl Jansen-Winkeln, “Das Ende des Neuen Reiches,“ Zeitschrift für Ägyptische Sprache 119 (1992): pp. 22–26; John Taylor, “The Third Intermediate Period (1069–644 BC),” in The Oxford History of Ancient Egypt, ed. Ian Shaw (Nova York, NY: Oxford University Press, 2000), pp. 331, 333. 12. O nome deste rei é geralmente escrito como Piye em traduções mais modernas (ver, por exemplo, Robert K. Ritner,  The Libyan Anarchy: Inscriptions from Egypt’s Third Intermediate Period [Atlanta, GA: Society of Biblical Literature, 2009], 1, 7, 492). Mas Piankhy também é uma leitura possível e era comumente usada em traduções mais antigas. Ver Ronald J. Leprohon, The Great Name: Ancient Egyptian Royal Titulary (Atlanta, GA: Society of Biblical Literature, 2013), pp. 160–162; Karola Zibelius-Chen, “Zur Problematik der Lesung des Königsnamens Pi(anch)i,” Der Antike Sudan 17 (2006): pp. 127–133. 13. Bowen, “Swearing,” p. 159. 14. Bowen, “Swearing,” p. 160. Nibley, Approaching, 284 gives the meaning “He [the god] is my life.” 15. Nibley, Lehi in the Desert, p. 28; Nibley, Approaching, pp. 284, 286 (Pakumeni); Book of Mormon Onomasticon, s.v. PACUMENI. 16. Nibley, Lehi in the Desert, p. 23; Book of Mormon Onomasticon, s.v. PACUMENI. 17. Veja, por exemplo, Cumen (3 Néfi 19:4), Quiscúmen (Helamã 1:9–12), Cumenôni (3 Néfi 19:4) e Cumeniá (Mórmon 6:14). Como os nomes kumen/cumen aparecem mais adiante no onomasticon do Livro de Mórmon, muito depois que os nefitas se fundiram com os mulequitas, que tiveram contato com os jareditas, alguns suspeitam que pode ser um elemento dos nomes jareditas. No entanto, no livro de Éter não há nomes com kumen/cumen portanto, sua conexão com a onomástica jaredita é incerta. 18. Smith, “Egyptianisms,” p. 38. Smith também menciona uma cidade hitita conhecida como Kumani. 19. Ver Book of Mormon Onomasticon, sv CUMENI. 20. William F. Albright to Grant S. Heward, July 25, 1966, colchetes adicionados, parênteses no original. A transcrição completa desta carta está em posse da equipe do BMC. Também citado em John A. Tvedtnes, John Gee e Matthew Roper, “Book of Mormon Names Attested in Ancient Hebrew Inscriptions,” Journal of Book of Mormon Studies 9, n. 1 (2000): p. 45. 21. Nibley, Lehi in the Desert, p. 22. 22. Nibley, Approaching, p. 284. Veja também Nibley, Lehi in the Desert, p. 23. 23. Bowen, “Swearing,” pp. 159–164.

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