KnoWhy #432 | Agosto 21, 2019
Por que há uma distinção entre "ladrões" no Livro de Mórmon?
Postagem contribuída por
Scripture Central

"E então eis que esses assassinos e saqueadores pertenciam a um grupo que havia sido formado por Quiscúmen e Gadiânton [...] e eram conhecidos como os ladrões e assassinos de Gadiânton". Helamã 6:18
O conhecimento
Embora a maioria dos leitores provavelmente não tenha pensado muito sobre esse detalhe, o Livro de Mórmon na tradução inglesa menciona consistentemente a palavra thieves e theft de uma maneira diferente do que quando se refere a robbers e robbery. É importante mencionar que essas palavras em português são traduzidas da mesma maneira: ladrões. O único exemplo em português onde ele faz uma distinção entre thieves e robbers é encontrado em Mórmon 2:10: ladrões e bandidos. Ao longo do registro nefita, os robbers são tipicamente gangues organizadas que se separaram da sociedade, se opuseram ao governo e subsistiram em grande parte saqueando seus inimigos. Os thieves, por outro lado, parecem ser pessoas dentro de uma comunidade que eram culpadas de roubar. Em termos simples, os robbers eram organizados em grupos de "estranhos", enquanto os thieves eram "membros" de uma comunidade que agia sozinha. Ilustrando essa diferença, John W. Welch e Kelly Ward explicaram que "os lamanitas sempre 'roubavam' dos nefitas, mas nunca de seus próprios irmãos —isso seria 'furtar', mas não 'roubar'. Também explica o surgimento e a temível ameaça da sociedade de Gadiânton, que sempre foi chamada de 'robbers' no Livro de Mórmon, nunca de 'thieves'."1 Embora essas diferenças, em termos ingleses, possam parecer sem importância para os leitores modernos e desconhecidas para os leitores de português, elas eram centrais para grande parte do mundo antigo. Com base na pesquisa de Bernard S. Jackson, Welch e Ward observaram "como os robbers geralmente agiam em grupos organizados, rivalizando com os governos locais e atacando cidades e como eles juraram e extorquiram resgates, uma ameaça considerada pior do que a guerra pura e simples. Os thieves, no entanto, eram uma ameaça muito menos séria para a sociedade".2 Sabemos que essa diferença era importante para o povo da Bíblia porque, assim como no Livro de Mórmon, seus autores se referiam consistentemente a thieves e robbers de maneira diferente. Novamente, com base na análise de Jackson, Welch explicou:
Em hebraico, os termos gazal (roubar) e gazlan (robber ou pessoa roubando) normalmente significavam tomar propriedade aberta e descaradamente, enquanto as palavras ganab (furtar) e gannab (thief) geralmente conotam roubar em segredo. Da mesma forma, o termo grego kleptes "foi usado para descrever uma pessoa furtiva que, sem violência, privava outra pessoa de sua propriedade", enquanto, pelo contrário, "no Velho Testamento e nos livros apócrifos, um λῃστής [lēstēs] é sempre um bandido, um saqueador, um membro de uma gangue cuja atividade ele realiza abertamente. Isso pertence a uma tropa que ataca caravanas ou assentamentos com armas e rouba suas propriedades".3
O porquê
Parece altamente improvável que Joseph Smith, contando com sua formação acadêmica e cultural, estivesse ciente de que existia uma antiga distinção entre robbers e thieves. Embora essa distinção seja consistente nos textos subjacentes do Velho e do Novo Testamentos, Welch mostrou que mesmo os "tradutores bem-educados do Rei James usavam as palavras theft (furto) e robbery (roubo) em inglês de forma intercambiável".4 Por exemplo, "a mesma frase é inconsistentemente traduzida como 'den of robbers' e 'den of thieves' em Jeremias 7:11 e Mateus 21:13. [E em português só foi chamado de "covil de ladrões" para os dois.] A mesma palavra (lestai) em inglês é traduzida às vezes como 'thieves' (Mateus 27:38) e às vezes como 'robbers' (João 18:40)."5 Se especialistas bíblicos treinados em línguas antigas ignoraram essa nuance, qual a probabilidade de um Joseph Smith sem instrução ter notado isso?6 Entender a diferença entre thieves e robberse seu uso no texto em inglês pode nos ajudar a entender melhor o significado de alguns eventos nas histórias do Livro de Mórmon. Por exemplo, os leitores podem se perguntar por que algumas pessoas, como Zemnaria, foram executadas sem qualquer julgamento ou processo legal comum. Welch observou: "Este tratamento pode ser explicado pelo status de ladrão de Zemnaria". Os robbers no mundo antigo eram mais do que thieves comuns; eles eram forasteiros e inimigos da mesma sociedade. Como tal, os antigos argumentaram que eles eram proibidos, proscritos e não tinham direito a processo legal."7 Assim, embora seja um detalhe aparentemente pequeno, a distinção entre thieves e robbersno Livro de Mórmon tem implicações importantes. Sua presença oferece boas evidências da antiguidade do Livro de Mórmon, bem como a atenção dada pelos autores do registro nefita à terminologia técnica e jurídica. Também pode ajudar os leitores a entender melhor as drásticas implicações sociais e legais dos robbers que aterrorizaram a civilização nefita com suas combinações secretas. Mais do que meros thieves, esses criminosos organizados sob juramento tentaram derrubar o governo nefita e sujeitar o povo ao seu governo.8 Como tal, eles sempre foram tratados como uma séria ameaça militar e foram rapidamente punidos como traidores ou bandidos.9
Leitura Complementar
John W. Welch, "Legal and Social Perspectives on Robbers in First-Century Judea", BYU Studies 36, no. 3 (1996–1997): pp. 141–153. Kent P. Jackson, "Revolutionaries in the First Century", BYU Studies 36, no. 3 (1996–1997): pp. 129–140. John W. Welch y Kelly Ward, "Thieves and Robbers", em Reexploring the Book of Mormon: A Decade of New Research, ed. John W. Welch (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1992), pp. 189–192. John W. Welch, "Theft and Robbery in the Book of Mormon and Ancient Near Eastern Law", FARMS Preliminary Report (1985). John W. Welch y John F. Hall, "Two Profiles of Robbers in the Ancient World", em Charting the New Testament (Provo, UT: FARMS, 2002), tabla 3-12.1. John W. Welch e Kelly Ward, "Thieves and Robbers", em Reexploring the Book of Mormon: A Decade of New Research, ed. John W. Welch (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1992), p. 248 Curiosamente, os nomes em inglês de dois líderes notáveis do bando de Gadiânton — Gaddianton e Giddianhi (Gadiânton e Gidiâni, cada um escrito com um duplo "d" no manuscrito original em inglês do Livro de Mórmon) — podem ter um significado simbólico relacionado à sua ocupação de robber. Ver Matthew L. Bowen, "'Swearing by Their Everlasting Maker': Some Notes on Paanchi and Giddianhi", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 28 (2018): pp. 164–168; John W. Welch, "Theft and Robbery in the Book of Mormon and Ancient Near Eastern Law", FARMS Preliminary Report (1985), pp. 30–31; Welch and Ward, "Thieves and Robbers", p. 249. 2. Welch e Ward, "Thieves and Robbers", p. 248. 3. John W. Welch, "Legal and Social Perspectives on Robbers in First-Century Judea", BYU Studies 36, no. 3 (1996–1997): p. 142; citando Bernard S. Jackson, Theft in Early Jewish Law, (Oxford: Clarendon, 1972), pp. 1–5. Ver também Kent P. Jackson, "Revolutionaries in the First Century", BYU Studies 36, no. 3 (1997): pp. 129–140. 4. Welch, "Legal and Social Perspectives", p. 148. 5. Welch e Ward, "Thieves and Robbers", p. 248. 6. É verdade que a linguagem jurídica nos dias de Joseph Smith oferecia uma distinção entre theft (furto) e robbery (roubo), mas, de acordo com Welch, essas distinções são "inconsistentes em muitos aspectos com os usos encontrados no Livro de Mórmon". Welch, "Theft and Robbery", p. 38. 7. John W. Welch, The Legal Cases in the Book of Mormon (Provo, UT: BYU Press and Neal A. Maxwell Institute for Religious Scholarship, 2008), p. 354. 8. Para obter mais informações sobre sociedades secretas no Livro de Mórmon, consulte o artigo da Central do Livro de Mórmon, "Por que o Livro de Mórmon usa a frase "combinações secretas"? (3 Néfi 7:6)", KnoWhy 377 (12 de junho de 2018). 9. Para saber mais sobre as táticas dos ladrões de Gadiânton, consulte o artigo da Central do Livro de Mórmon, "A representação da guerra de guerrilha no Livro de Mórmon é realista? (Helamã 11:25)", KnoWhy 423.