KnoWhy #549 | Fevereiro 24, 2020

Por que Jacó condenou o assassinato “deliberado”?

Postagem contribuída por

 

Scripture Central

"Ai do homicida, que mata deliberadamente, porque morrerá" 2 Néfi 9:35

O Conhecimento

Pouco depois de os nefitas construírem seu primeiro templo no Novo Mundo e pedirem a Néfi que fosse seu rei, Néfi consagrou seus irmãos Jacó e José como sacerdotes e pediu a Jacó que falasse ao povo (2 Néfi 5:16-18, 26; 6:1–4). O acontecimento do discurso de Jacó provavelmente ocorreu durante uma das festas de outono prescritas pela Bíblia, durante a qual os nefitas teriam coroado a Néfi formalmente como seu rei terreno e jurado lealdade ao Senhor, como seu verdadeiro rei.1

Como parte de sua mensagem, Jacó pronunciou dez "ais" que são semelhantes aos Dez Mandamentos (2 Néfi 9:27–38).2

Imagem de Charting the book of Mormon

Curiosamente, outro Decálogo ou Dez Mandamentos, como são chamados em Êxodo 34:27–28, estão em Êxodo 34:14, 17–23, 25–26. Essa lista é dedicada às práticas de sacrifício e rituais, embora os mandamentos 1, 2 e 6 tenham suas contrapartes no Decálogo básico descrito em Êxodo 20. Em resumo, os mandamentos de Êxodo 34 são os seguintes:

  1. Não te inclinarás diante de outro deus.
  2. Não farás para ti deuses de fundição.
  3. A festa dos pães ázimos guardarás.
  4. Todo primogênito de teus filhos resgatarás.
  5. Ninguém aparecerá de mãos vazias diante de mim.
  6. Ao sétimo dia descansarás.
  7. Guardarás a festa das semanas.
  8. Três vezes no ano todos os vossos homens aparecerão perante o Senhor Deus.
  9. Não ofereceras nada levedado com o sangue do meu sacrifício.
  10. Não cozerás o cabrito no leite de sua mãe.

A existência desses dois conjuntos de mandamentos correlatos, porém distintos, no livro de Êxodo, demonstra que a lista de mandamentos poderia ser alterada com o tempo ou para adequar-se às necessidades do povo em diferentes circunstâncias.

De acordo com Moshe Weinfeld, os Dez Mandamentos em Êxodo 20 eram "o documento base da comunidade israelita". Foram dados a Moisés no Sinai, "no início da história israelita", como a base do convênio de Deus com Israel (Êxodo 20:2–17). 3 Portanto, Weinfeld argumenta que "estabelecem as condições básicas para a inclusão na comunidade de Israel" e compreendem "a essência das exigências de Deus a seus confederados".4 Como tal, esses mandamentos eram lidos durante os festivais israelitas como parte da renovação de seus convênios com o Senhor no templo.5

Da mesma forma, os dez "ais" de Jacó, pronunciados em uma ocasião festiva, no início da história nefita, provavelmente tiveram uma função semelhante para o povo nefita. John W. Welch explicou:

Seus "dez ais" funcionam como o equivalente do conjunto contemporâneo de dez mandamentos nefitas. Sua declaração é um admirável resumo dos valores religiosos básicos dos nefitas, moldados de forma totalmente adequada à antiga Israel e ao Oriente Próximo. 6

Assim como os mandamentos em Êxodo 34, a lista de Jacó não é simplesmente uma repetição ou "cópia impensada de ideais bíblicos". Ao contrário, "os princípios de Jacó foram adaptados como uma revelação para seu povo e suas necessidades.7

Um exemplo de como Jacó adaptou e esclareceu habilmente o Decálogo original é encontrado em seu sétimo "ai", paralelo ao sexto dos Dez Mandamentos: "Não matarás" (Êxodo 20:13; Deuteronômio 5:17), mencionado por Jacó como: "Ai do homicida, que mata deliberadamente, porque morrerá" (2 Néfi 9:35, ênfase adicionada).

Falando na época ou perto da coroação de Néfi, "Jacó provavelmente não poderia ter comentado sobre a lei do homicídio sem que lhe ocorresse que Néfi matou Labão".8 Na verdade, alguns dos próprios emblemas da realeza nefita, como as placas de latão e a espada de Labão, foram obtidos porque Néfi matou a Labão.9 Como Welch observou, nessas circunstâncias, "amaldiçoar categoricamente todas as pessoas que cometeram homicídio [...] teria sido extremamente pouco diplomático",10 e assim, Jacó teria, naturalmente, incluído o qualificador "deliberadamente", para distinguir a lei básica do homicídio culposo do caso incomum, porém legalmente distinguível de Néfi.

Néfi relatou cuidadosamente o incidente da morte de Labão para mostrar que o Senhor o colocou deliberadamente em suas mãos, tornando suas ações não premeditadas e defensáveis sob a lei de Êxodo 21:12-14 (1 Néfi 4).11 Portanto, Néfi matar a Labão não foi deliberado no sentido de envolver "intenção, perseguição ou outro planejamento, ou ódio semelhante" e não era culpado sob a lei israelita.12 Na prática, isso significava que ele e outros homicidas estariam autorizados a evadir-se, buscando refúgio em outra cidade, ou deixando a Terra Santa para trás, como fizeram Néfi e toda a família de Leí.

O porquê

Conforme discutido acima, tanto os Dez Mandamentos do Velho Testamento quanto os dez ais de Jacó no Livro de Mórmon provavelmente funcionavam como "um conjunto de obrigações básicas concisas dirigidas a todos os membros da comunidade israelita [ou nefita], ligados por um convênio especial com Deus". 13 Nesse sentido, esses mandamentos ou "ais" atuam de maneira semelhante às perguntas feitas pelos bispos e presidentes de estaca Santos dos Últimos Dias nas entrevistas de recomendação para o batismo e para o Templo, ou seja, identificam os padrões básicos pelos quais a pessoa deve viver para ser um membro da comunidade Santo dos Últimos Dias fiel, e ser digno de entrar no templo sagrado e fazer determinados convênios com Deus.

Esses conjuntos bíblicos de mandamentos morais também se referem à santidade, dignidade e fidelidade. O presidente Russell M. Nelson explicou recentemente que o Senhor "deu orientações referentes ao que cada pessoa deve fazer a fim de se qualificar para entrar em Sua casa sagrada", e enfatizou que "todos os requisitos para se entrar no templo estão relacionados à santidade pessoal".

Embora os padrões do Senhor permaneçam constantes e consistentes, na conferência de outubro de 2019, o Presidente Nelson anunciou que algumas perguntas feitas nas entrevistas de recomendação para o templo foram ''alteradas para que haja mais clareza".14 Tanto a reafirmação inspirada de Jacó quanto a adaptação dos Dez Mandamentos originais em "um conjunto de princípios relevantes para seu povo e suas necessidades e preocupações culturais",15 e a existência de um segundo conjunto de "Dez Mandamentos" em Êxodo 34, ilustram esse processo e a necessidade de esclarecer as leis e regulamentos de Deus por meio da autoridade de Seus líderes do Sacerdócio, dada a Seu povo na mudança dos tempos e circunstâncias, é antiga e concorda com os precedentes bíblicos.

Assim como o esclarecimento de Jacó de que o homicídio deliberado, o condenável pela lei, é consistente com a intenção original das leis de Deus sobre homicídio para os israelitas (ver Êxodo 21:13-14), também deixa claro que a intenção original deve ser explicitamente compreendida quando houverem dúvidas. Da mesma forma, as recentes atualizações e esclarecimentos dados pelos servos do Senhor sobre as perguntas da entrevista de recomendação para o Templo permanecem consistentes com os padrões de dignidade já estabelecidos por Deus para entrarmos no templo hoje.

Leitura Complementar

Central do Livro de Mórmon, ''Por que Jacó declarou tantos 'ais'? (2 Néfi 9:27)'', KnoWhy 35 (13 de fevereiro de 2017). John W. Welch, ''Jacob’s Ten Commandments'', em Reexploring the Book of Mormon: A Decade of New Research, ed. John W. Welch (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1992), pp. 69–72. John W. Welch, ''Legal Perspectives on the Slaying of Laban'', Journal of Book of Mormon Studies 1, nº. 1 (1992): pp. 119–141.

1. Ver o artigo da Central do Livro de Mórmon, ''Jacó se referiu aos festivais de outono de Israel? (2 Néfi 6:4)'', KnoWhy 32 (9 de fevereiro de 2017). Para obter mais informações, consulte John S. Thompson, ''Isaiah 50–51, the Israelite Autumn Festivals, and the Covenant Speech of Jacob in 2 Nephi 6–10'', em Isaiah in the Book of Mormon, ed. Donald W. Parry e John W. Welch (Provo, UT: FARMS, 1998), pp. 123–150. 2. Ver o artigo da Central do Livro de Mórmon, ''Por que Jacó declarou tantos 'ais'?? (2 Néfi 9:27)", KnoWhy 35 (13 de fevereiro de 2017). Para obter mais informações, consulte John W. Welch, ''Jacob’s Ten Commandments'', em  Reexploring the Book of Mormon: A Decade of New Research, ed. John W. Welch (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1992), pp. 69–72.

Ver também John W. Welch, ''Counting to Ten'', Journal of Book of Mormon Studies 12, nº. 2 (2003): pp. 48–49. 3. Moshe Weinfeld, ''What Makes the Ten Commandments Different?'' Bible Review 7, nº. 2 (abril de 1991): p. 41. 4. Weinfeld, ''What Makes the Ten Commandments Different?'' pp. 37-385. Weinfeld, ''What Makes the Ten Commandments Different?'' p. 41. Para uma explicação mais detalhada dessas ideias, consulte Moshe Weinfeld, ''The Decalogue: Its Significance, Uniqueness, and Place in Israel’s Tradition'', em Religion and Law: Biblical-Judaic and Islamic Perspectives, ed. Edwin Firmage, Bernard G. Weiss e John W. Welch (Winona Lake, IN: Eisenbrauns, 1990), pp. 3–47. 6. Welch, ''Jacob’s Ten Commandments'', p. 72. 7. Welch, ''Jacob’s Ten Commandments'', p. 70. 8. Welch, ''Jacob’s Ten Commandments'', p. 71. 9. Ver Brett L. Holbrook, ''The Sword of Laban as a Symbol of Divine Authority and Kingship'',  Journal of Book of Mormon Studies 2, nº. 1 (1993): pp. 39–72; Brett L. Holbrook, ''Sword of Laban as a Symbol of Divine Authority'', em  Pressing Forward with the Book of Mormon: The FARMS Updates of the 1990s, ed. John W. Welch y Melvin J. Thorne (Provo, UT: FARMS, 1999), pp. 93–96; Gordon C. Thomasson, ''Mosiah: The Complex Symbolism and Symbolic Complex of Kingship in the Book of Mormon'', Journal of Book of Mormon Studies 2, nº. 1 (1993): pp. 21–38. 10. John W. Welch, ''Legal Perspectives on the Slaying of Laban'', Journal of Book of Mormon Studies 1, nº. 1 (1992): p. 138. 11. Consulte o artigo da Centra do Livro de Mórmon "A morte de Labão por Néfi foi legal? (2 Néfi 6:4)'', KnoWhy 256 (24 de novembro de 2017). Ver também Welch, ''Legal Perspectives on the Slaying of Laban'', pp. 119–141; John W. Welch, ''Narrative Elements in Homicide Accounts'', Jewish Law Association Studies 27 (2017): pp. 206–238; John W. Welch, ''Homicides in the Old Testament and the Book of Mormon'', Clark Memorandum, Fall 2018, pp. 22–35. 12. Welch, ''Legal Perspectives on the Slaying of Laban'', p. 138. 13. Weinfeld, ''What Makes the Ten Commandments Different?'' p. 40 14. Presidente Russell M. Nelson, ''Considerações finais'', Conferência Geral de outubro de 2019, disponível em churchofjesuschrist.org. 15. Welch, ''Jacob’s Ten Commandments'', p. 72.

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