KnoWhy #548 | Fevereiro 6, 2020

Por que o arco de “aço puro” de Néfi quebrou?

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Scripture Central

"Eis que quebrei meu arco, que era feito de aço puro" 1 Néfi 16:18

O Conhecimento

Enquanto viajava pelo deserto, Néfi menciona que sua família parou em uma expedição de caça. Néfi, "sa[iu] para caçar [...] [e quebrou seu] arco, que era feito de aço puro" (1 Néfi 16:18). A referência ao arco de aço de Néfi evoca várias passagens bíblicas que se referem a um arco, o que na [Bíblia] versão Rei Jaime que Joseph Smith possuía, é traduzido como "arco de aço", mas que na versão Almeida 2015 é traduzido como "arco de bronze".

''Instrui as minhas mãos para a peleja, de maneira que um arco de bronze se quebra pelos meus braços" (2 Samuel 22:35; Salmos 18:34). "Ainda que fuja das armas de ferro, o arco de bronze o atravessará" (Jó 20:24).

A versão Rei Jaime traduz o termo como "aço", a partir da palavra hebraica nhwsh que, na verdade, significa "bronze", sendo traduzido dessa maneira nas traduções inglesas mais recentes. 1 A tradução da Bíblia Rei Jaime da palavra aço reflete uma gama de significados mais antigos e amplos, que não incluem apenas o ferro carburado (o que hoje denominamos aço), mas também ligas de cobre endurecidas, como o bronze. Esse significado mais amplo de aço em inglês também é compartilhado com outros idiomas europeus.2 Na tradução do Livro de Mórmon, este significado mais amplo também poderia ter sido usado para aço, indicando que o arco de "aço puro" de Néfi era semelhante ao arco de bronze (nhwsh em hebraico) mencionado na Bíblia.

De acordo com Frank Moore Cross e David Noel Freedman, o arco de bronze nas passagens bíblicas não se refere a um arco feito inteiramente de metal, mas que "provavelmente se refere a um arco composto, revestido e/ou folheado com bronze".3 Esses arcos podem ser "decorados ou reforçados em certas partes (geralmente a palheta superior, batente ou o punho) com bronze".4 Era mais comum que os arcos compostos fossem feitos com uma base de madeira, chifre e tendões animais. Esses materiais eram combinados para formar um único objeto, projetado em formato biconvexo, poderoso o suficiente para disparar flechas capazes de perfurar objetos a 300-400 metros de distância.5 Além disso, seria menor e mais leve do que os arcos comuns. Estes arcos eram muito eficazes e temidos em batalha, contudo de fabricação complexa e dispendiosa. "Por um período considerável após a introdução do arco composto, o arco permaneceu sendo principalmente uma arma da realeza".6

São relativamente poucos os arcos compostos que sobreviveram do antigo Oriente Próximo. Antes da descoberta da tumba do rei Tutancâmon, apenas dez desses arcos eram conhecidos, entretanto, entre os tesouros da tumba de Tutancâmon, foram encontrados 27 arcos compostos. Embora algumas das armas fossem puramente cerimoniais, "a maioria das armas era utilitária".7 Uma dessas armas, o chamado "Arco da Honra", era belamente decorado com folhas de ouro na empunhadura, nas paletas inferior, média e superior, bem como nas pontas da arma.8 Howard Carter, que descobriu e escavou a tumba, descreve-a como "uma obra de sutileza inconcebível",9 lembrando-nos da descrição de Néfi de seu próprio arco de "aço puro "(1 Néfi 16:18).

De acordo com W. McLeod, o "Arco da Honra" de Tutancâmon, "teria sido encordoado" e usado.10 É razoável supor, com base nas referências bíblicas a um "arco de bronze", que o mesmo pudesse ser feito em bronze para fins decorativos ou para fortalecer partes de um arco composto, sem aumentar substancialmente seu peso.

O porquê

Compreender que o arco de Néfi provavelmente não era inteiramente feito de aço ou bronze, mas um arco composto por lâminas de aço e bronze, é importante para entender como o arco poderia ter se quebrado no deserto da Arábia. William J. Hamblin, uma autoridade em guerra do Antigo Oriente Próximo, observou:

Os arcos compostos têm um problema estrutural específico que os torna suscetíveis a mudanças de temperatura e clima, o que pode fazer com que o arco se deforme e quebre. [...] Portanto, se o arco de Néfi fosse do tipo composto, a passagem do clima temperado da Palestina para o calor seco da península arábica poderia ter contribuído para o risco de deformação e quebra de seu arco.11

Além disso, esses arcos podem sofrer fraturas nas extremidades do metal mais rígido, criando pontos de pressão onde e quando a madeira, ou os materiais mais flexíveis, são puxados.

No entanto, além dos fatores ambientais e físicos, haviam lições espirituais que a família de Leí precisavam aprender com tal incidente.12 Como observou Alan Goff: "A mensagem do arco quebrado é que o povo do Senhor não deve confiar no braço de carne, e sim, confiar no braço do Senhor".13

Quando o arco de Néfi foi quebrado, Lamã, Lemuel e até mesmo Leí ''começ[aram] a murmurar contra o Senhor seu Deus'' (1 Néfi 16:20). Depois que Néfi construiu um novo arco e flecha, perguntou a seu pai onde deveria caçar, um gesto que fez Leí humilhar-se, e ele "perguntou ao Senhor" (1 Néfi 16:24). Em resposta à sua pergunta, foi pedido a Leí que olhasse a Liahona. Foi nessa ocasião que Néfi aprendeu que as agulhas da Liahona ''moviam-se conforme a fé e a diligência e a atenção que lhes dávamos'', portanto, ''por meio de pequenos recursos, pode o Senhor realizar grandes coisas'' ( 1 Néfi 16: 28–29).

Atendendo aos ponteiros da Liahona, que lhe diziam onde encontrar comida, Néfi voltou ao acampamento ''levando os animais que havia matado'', forçando sua família a “se [humilhar] perante o Senhor” (1 Néfi 16:32). Néfi e sua família aprenderam a lição ensinada pelo salmista: ''Pois eu não confiarei no meu arco, nem a minha espada me salvará. Mas tu nos salvaste [...] Em Deus nos gloriamos todo o dia, e louvamos o teu nome eternamente" (Salmos 44:6–8).

Os leitores do Livro de Mórmon atuais podem aprender com o exemplo de Néfi. Quando as coisas derem errado ou obstáculos inesperados surgirem no caminho, em vez de murmurar e reclamar, essa poderá ser uma oportunidade de depositar confiança no Senhor, em vez de confiar no "braço da carne" (2 Néfi 4:34).

Leitura Complementar

Central do Livro de Mórmon, ''O que simboliza a história do arco quebrado de Néfi? (1 Néfi 16:23)'', KnoWhy 421 (5 de setembro de 2018). William J. Hamblin, ''The Bow and Arrow in the Book of Mormon'', em Stephen D. Ricks e William J. Hamblin, eds., Warfare in the Book of Mormon (Salt Lake City e Provo: Deseret Book e FARMS, 1990), pp. 365–399. Alan Goff, ''A Hermeneutic of Sacred Texts: Historicism, Revisionism, Positivism, and the Bible and the Book of Mormon'' (Master’s Thesis, Brigham Young University: 1989).

1. "Bow of bronze" (Arco de bronze) em inglês NASB, NRSV, NIV, e a NKJV. "Arco de bronze" nas versões LBLA, RVR1977, RVA, NBLA. 2. O vidreiro de Florença, Antonio Neri, usou a palavra acciaio (aço) por bronze em seu influente livro, The Art of Glass traduzido para o inglês no ano de 1662 (Paul Engle, ''Mirror, Mirror, on the Wall'', Conciatore: The Life and Times of 17th Century Glassmaker Antonio Neri, 20 de janeiro de 2015 https://www.conciatore.org/2015/01/). Da mesma forma, o historiador espanhol Tezozomoc registrou que os tarascos do oeste do México tinham capacetes de aço, embora provavelmente se referisse a bronze, e não ao aço verdadeiro (Edward Kingsborough, Antiquities of México [Londres: Henry G. Bohn, 1848], 9: p. 83) Sobre a tecnologia do bronze tarasco na última era pré-colombiana, ver Dorothy Hosler, The Sounds and Colors of Power: The Sacred Metallurgical Technology of West Mexico [Londres: MIT Press, 1994], p. 21). O significado do hebraico nhwsh  possivelmente se estendeu ao aço atual pelo comentarista judeu medieval Joseph Kimhi, que traduziu o nhwsh como "metal duro". (Steven Shnider, ''Psalm XVIII: Theophany, Epiphany, Empowerment'', Vetus Testamentum 56, nº. 3 [2006]: p. 394.) 3. Frank Moore Cross Jr. e David Noel Freedman, ''A Royal Song of Thanksgiving: II Samuel 22 = Psalm 18'', Journal of Biblical Literature 72, nº. 1 (março de 1953): p. 31. Roland De Vaux, Ancient Israel: It’s Life and Institutions. Traduzido por John McHugh (Grand Rapids: Eerdmans, 1997), p. 243: "O termo refere-se a revestimentos metálicos de certos arcos." Peter C. Craigie, Word Biblical Commentary. Salmos 1-50 (Waco, Texas: Word Press, 1982), p. 176: "A expressão 'arco de bronze' pode indicar um arco de madeira com decorações em bronze, ou flechas com ponta de bronze disparadas de grandes arcos, ou, poderia ser uma forma poética de descrever a grande força do arco de um guerreiro". 4. William J. Hamblin, ''The Bow and Arrow in the Book of Mormon'', em Warfare in the Book of Mormon, ed. Stephen D. Ricks e William J. Hamblin (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1990), p. 374. 5. Yigael Yadin, The Art of Warfare in Biblical Lands (New York: McGraw-Hill, 1963), 1: pp. 7–8. 6. Cross e Freedman, "Royal Song of Thanksgiving", p. 31. 7. Karl Chandler Randall IV, ''Origins and Comparative Performance of the Composite Bow'' (Disertación doctoral, University of South Africa: 2016), p. 61. 8. Conforme citado por W. McLeod: ''Os detalhes de sua fabricação estão ocultos pela folha de ouro e incrustados com finas filigranas de ouro com pedras e vidro colorido. O arco não é totalmente revestido com folhas de ouro em uma peça única; na verdade, cada banda simples é composta por uma única peça de ouro; as bandas decorativas se sobrepõem em cada borda com uma largura de 0,004". Ele também observa: "Como o ouro do "Arco de Honra" não é contínuo, mas foi fixado em zonas, presume-se ser possível ter sido encordoado." W. McLeod, Composite Bows from the Tomb of Tutankhamun (Oxford: Oxford University Press, 1970), pp. 10, 12. 9. Ver Nicholas Reeves,  The Complete Tutankhamun (Londres: Tamisa and Hudson), pp. 174-175. 10. McLeod, Composite Bows, p. 12. 11. Hamblin, ''The Bow and Arrow in the Book of Mormon'', p. 374. 12. Para uma discussão sobre o simbolismo adicional nesta narrativa, consulte o artigo da Central do Livro de Mórmon, ''O que simboliza a história do arco quebrado de Néfi? (1 Nefi 16:23)'', KnoWhy  421 (5 de setembro de 2018). 13. Alan Goff, ''A Hermeneutic of Sacred Texts: Historicism, Revisionism, Positivism, and the Bible and the Book of Mormon'' (Master’s Thesis, Brigham Young University: 1989), p. 95.

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