KnoWhy #567 | Junho 2, 2020
Por que os amonitas fizeram um convênio de não empunhar suas armas?
Postagem contribuída por
Scripture Central
"Ora, não havia uma só alma, entre todo o povo que se convertera ao Senhor, que quisesse pegar em armas contra seus irmãos; não, não queriam nem mesmo fazer qualquer preparativo de guerra"
O conhecimento
Por meio dos esforços diligentes e entusiásticos dos filhos de Mosias como transmissores de paz e boas novas entre os lamanitas (Mosias 27:37; 28:1–2)1, "milhares foram levados a conhecer o Senhor" (Alma 23:5). Esses lamanitas convertidos se autodenominaram ânti-néfi-leítas (Alma 23:17).2 Em um esforço para se arrependerem de seus atos pecaminosos de homicídio e violência, enterraram suas armas de guerra e fizeram o convênio para nunca mais derramar o sangue de seus inimigos, mesmo em legítima defesa (Alma 24:6–19). Logo, em um dos atos mais emocionantes e corajosos de todo o Livro de Mórmon, se colocaram diante de seus inimigos desarmados e impotentes, prostrando-se em oração perante o Senhor enquanto seus inimigos os atacavam (Alma 24:21–22; cf. 27:1–3).
Amon explicou que o amor por seus irmãos foi um dos principais incentivos no ato de autossacrifício dos ânti-néfi-leítas (Alma 26:31-34). Os ânti-néfi-leítas também foram motivados por um forte desejo de se arrepender de seus pecados e dos "muitos homicídios" que haviam cometido (Alma 24:9-11, 25; 27:6, 8). Uma vez que isso parece se referir principalmente à morte dos nefitas durante a guerra, alguns concluíram que os ânti-néfi-leítas se tornaram "pacifistas extremos", que passaram a considerar todos os homicídios em tempos de guerra como homicídios e, portanto, como algo ilegítimo.3 A história completa dos ânti-néfi-leítas (também conhecidos como o povo de Amon, ver Alma 27:26), no entanto, "apresenta certas dificuldades para quem apela aos amonitas como modelo claro de pacifistas absolutos".4
Por um lado, embora os ânti-néfi-leítas recusassem a se envolver no derramamento de sangue, aceitaram a proteção militar nefita (Alma 27:23-24) e apoiaram ativamente os esforços de guerra nefitas (Alma 27:24; 43:13). Até mesmo desejaram juntar-se à guerra em determinado momento, embora tenham sido convencidos a manter-se fiéis a seu convênio por Helamã (Alma 53:13-15). No entanto, seus filhos, que eram muito jovens na época para fazerem o convênio contra o derramamento de sangue, juntaram-se aos exércitos nefitas (Alma 53:17).5 Se o povo de Amon realmente sentia que as mortes em tempos de guerra eram homicídios, é difícil imaginar por que apoiariam seus próprios filhos na guerra.6 Como explicou Duane Boyce: "Todas essas ações são contradições diretas de uma renúncia completa e baseada em princípios à guerra".7
Em vez de assumir uma denúncia direta de todos os aspectos da guerra, parece que os ânti-néfi-leítas passaram a ver sua própria conduta e atitudes passadas em relação à guerra como homicídio. Boyce apontou que, historicamente, os lamanitas foram os agressores, motivados por seu ódio aos nefitas e seu prazer em derramar sangue. Isso tornou sua participação em guerras e outros conflitos verdadeiramente sanguinária.8 Além disso, como Brant A. Gardner mencionou, eles podem ter participado de antigas práticas religiosas mesoamericanas bem conhecidas que glorificavam a guerra, o derramamento de sangue e o sacrifício humano. Tais atos de matança glorificada seriam naturalmente entendidos como homicídios para discípulos de Cristo recém-convertidos.9
Boyce observou: "Dada a dura realidade de seu passado e a dificuldade de seu arrependimento, não é surpreendente que eles sentissem a necessidade de manter o perdão, repudiando não apenas o homicídio, mas também qualquer coisa remotamente parecida a isto".10 É compreensível que temessem e pensassem ''se novamente as mancharmos, talvez não possam mais ser lavadas pelo sangue do Filho de nosso grande Deus, que será derramado para a expiação de nossos pecados" (Alma 24:13). Os nefitas entendiam o ''temor [dos amonitas] de empunhar armas contra seus irmãos, para que não aconteça que cometam pecado" Alma 27:23). Segundo as antigas interpretações em Deuteronômio 20, os nefitas permitiram aos ânti-néfi-leítas uma liberação condicional de seu serviço militar.11
O porquê
Não há dúvida de que os ânti-néfi-leítas "deram o que deve ser um dos exemplos mais inspiradores de arrependimento, contrição, humildade e devoção constante ao Senhor que pode ser encontrado em qualquer parte das escrituras".12 Eles reconheceram que a natureza extrema de seus pecados passados exigia que tomassem medidas igualmente extremas para se arrependerem completamente e evitar repetirem esses pecados no futuro. No entanto, mesmo que sua situação fosse única, não significa que as pessoas não possam aprender com seu exemplo. Seja qual for a natureza dos pecados e lutas pessoais, o exemplo dos ânti-néfi-leítas pode inspirar todos ao arrependimento sincero, até mesmo a enterrar as transgressões mais arraigadas e flagrantes, e voltar-se para Cristo.
Além disso, a história dos ânti-néfi-leítas fornece duas evidências exemplares de como o Evangelho de Jesus Cristo pode trazer paz e vencer a violência. Primeiramente, sua decisão de não pegar em armas, mesmo em legítima defesa, levou alguns dos lamanitas que os atacavam a ter compaixão, arrepender-se e depor suas armas de guerra e juntar-se aos ânti-néfi-leítas, enquanto o restante dos lamanitas cessaram seus ataques em frustração. Alguns do povo de Amon foram mortos, mas um número ainda maior de lamanitas juntou-se a eles na paz do evangelho, e o conflito terminou antes que ocorresse mais perda de vidas (Alma 24:21–26; 25:1).
Em uma segunda ocasião, o povo de Amon foi atacado e, novamente, se recusaram a pegar em suas armas em legítima defesa e, desta vez, seus atacantes foram implacáveis (Alma 27:1-3). No entanto, os nefitas tiveram pena deles e ofereceram-lhes uma herança de terras e forneceram-lhes proteção militar, apesar de "seus inúmeros homicídios e de sua terrível iniquidade" do passado (Alma 27:22-23). Assim, os nefitas que antes queriam pegar "em armas contra eles [os lamanitas] para exterminá-los" porque viviam "na mais vil iniquidade" (Alma 26:24-25) estavam agora dispostos a perdoar esses lamanitas que se arrependeram de seus pecados mais graves e a se juntar a eles em paz e fornecer proteção. É difícil avaliar quão grande deve ter sido aquele ato de perdão.
Isto não significa que sempre será possível evitar a guerra e a violência. Por mais trágica e horrível que seja, a guerra às vezes é necessária e justificada (Alma 43:45–47; 48:14–16, 23–25).13 No entanto, a história dos ânti-néfi-leítas é um exemplo de como "a pregação da palavra" realmente tem "um efeito mais poderoso sobre a mente do povo do que a espada" (Alma 31:5). O Élder L. Tom Perry comentou: ''Embora a mensagem da história não seja insistir no pacifismo universal, aprendemos que, ao não devolver as agressões dos outros, podemos ter um efeito profundo sobre eles. Podemos literalmente mudar seus corações quando seguimos o exemplo de Cristo e oferecemos a outra face. Nossos exemplos como seguidores pacíficos de Cristo inspiram outros a segui-lo''.14
Leitura Complementar
Duane Boyce, "The Ammonites Were Not Pacifists", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 20 (2016): pp. 293–313. Brant A. Gardner, Traditions of the Fathers: The Book of Mormon as History (Salt Lake City, UT: Greg Kofford Books, 2015), pp. 305–307. J. David Pulsipher, "The Ammonite Conundrum", em War and Peace in Our Times: Mormon Perspectives, ed. Patrick Q. Mason, J. David Pulsipher e Richard L. Bushman (Salt Lake City, UT: Greg Kofford Books, 2012), pp. 1–12. Duane Boyce, "Were the Ammonites Pacifists?" Journal of Book of Mormon and Restoration Scripture 18, nº. 1 (2009): pp. 32–47. John W. Welch, "Exemption from Military Duty", em Reexploring the Book of Mormon: A Decade of New Research, ed. John w. Welch (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1992), pp. 189–192.1. John A. Tvedtnes, "The Sons of Mosíah: Emissaries of Peace", em Warfare in the Book of Mormon, ed. Stephen D. Ricks e William J. Hamblin (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1990), pp. 118–123. 2. Central do Livro de Mórmon, "Por que os lamanitas convertidos demominavam-se "Ânti-Néfi-Leítas"? (Alma 23:17)", KnoWhy 131 (9 junho de 2017). 3. Ver, por exemplo, Hugh Nibley, Since Cumorah, 2a ed. (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1988), pp. 295–296; Hugh Nibley, The Prophetic Book of Mormon (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1989), pp. 356, 466, 487, 517; Eugene England, "Hugh Nibley como Cassandra", BYU Studies 30, nº. 4 (1990): p. 112; Patrick Q. Mason, "The Possibilities of Mormon Peacebuilding", Dialogue: A Journal of Mormon Thought 37, nº. 1 (2004): pp. 14–18; Grant Hardy, Understanding the Book of Mormon: A Reader’s Guide (Nova York, NY: Oxford University Press, 2010), p. 118; Mack C. Stirling, "Violence in the Scripture: Mormonism and the Cultural Theory of René Girard", Dialogue: A Journal of Mormon Thought 43, nº. 1 (2010): pp. 84–85. Ver também os artigos de FR Rick Duran (p. 61), Loyd Ericson (pp. 182–183) e Gordon Conrad Thomasson (p. 214) em War and Peace in Our Times: Mormon Perspectives, ed. Patrick Q. Mason, J. David Pulsipher e Richard L. Bushman (Salt Lake City, UT: Greg Kofford Books, 2012). Para um relato interpretativo dessa história, enfatizando como ela tem sido usada para apoiar uma ética de paz e não-violência, consulte J. David Pulsipher, "Buried Swords: The Shifting Interpretive Ground of a Beloved Book of Mormon Narrative", Journal of Book of Mormon Studies 26 (2017): pp. 1–48. Para uma análise do que constitui o pacifismo, ver Duane Boyce, Even Unto Bloodshed: An LDS Perspective on War (Salt Lake City, UT: Greg Kofford Books, 2015), pp. 17–45. 4. J. David Pulsipher, "The Ammonite Conundrum", em War and Peace in Our Times, 3. No entanto, Pulsipher, "Buried Swords", pp. 4-12, argumenta que partes da história representam uma "sensibilidade pacifista" (p. 5) e uma "forma de pacifismo absoluto" (p. 6). 5. Ver Boyce, Even Unto Bloodshed, pp. 49–71; Duane Boyce, "Were the Ammonites Pacifists?" Journal of Book of Mormon and Restoration Scripture 18, nº. 1 (2009): pp. 32–47; Duane Boyce, "The Ammonites Were Not Pacifists", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 20 (2016): pp. 293–313. 6. Ver Boyce, "Were the Ammonites Pacifists?" pp. 43-44.
7. Boyce, "The Ammonites Were Not Pacifists", p. 298. 8. Boyce, "The Ammonites Were Not Pacifists", pp. 302–308. 9. Brant A. Gardner, Traditions of the Fathers: The Book of Mormon as History (Salt Lake City, UT: Greg Kofford Books, 2015), pp. 305–307. 10. Boyce, "The Ammonites Were Not Pacifists", p. 308. 11. Consulte a Central do Livro de Mórmon, "Por que o povo de Amon foi liberado do serviço militar? (Alma 27:24)", KnoWhy 274 (20 de dezembro de 2017). John W. Welch, "Law and War in the Book of Mormon", em Warfare in the Book of Mormon, pp. 62–65; John W. Welch, "Exemption from Military Duty", em Reexploring the Book of Mormon: A Decade of New Research, ed. John W. Welch (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1992), pp. 189–192. 12. Boyce, Even Unto Bloodshed, p. 71. 13. Ver Boyce, Even Unto Bloodshed, pp. 213–278 para obter uma conexão com a teoria da guerra justificada com base nos ensinamentos e princípios das Escrituras dos Santos dos Últimos Dias. Ver também Morgan Deane, "Offensive Warfare in the Book of Mormon and a Defense of the Bush Doctrine", em War and Peace, pp. 29–39. 14. L. Tom Perry, Living with Enthusiasm (Salt Lake City, UT: Deseret Book, 1996), p. 128.