KnoWhy #443 | Outubro 17, 2018
Por que os autores do Livro de Mórmon usaram colofões?
Postagem contribuída por
Scripture Central

"E sei que o registro que faço é verdadeiro; e faço-o com minhas próprias mãos e faço-o de acordo com o meu conhecimento." 1 Néfi 1:3
O conhecimento
Desde o trabalho pioneiro de Hugh Nibley,1 pesquisadores observaram que o Livro de Mórmon contém os chamados "colofões" (da palavra grega kolofōn, que significa "cume", "topo" ou "final"). "Na antiguidade", explicou um pesquisador, "era comum que o início e/ou final de um texto literário fossem destacados por meio de colofões. Os colofões, como cabeçalhos e assinaturas, continham uma variedade de informações pertinentes ao texto publicado, incluindo detalhes sobre o destinatário, autor, escriba, assunto, informações cronológicas, entre outras.)".2 O colofão introdutório de Néfi é indiscutivelmente o exemplo mais notável de seu uso no Livro de Mórmon. Após resumir o conteúdo de seu registro e identificar-se como escriba e autor do texto, Néfi inicia seu registro afirmando: (1) sua boa origem e criação, (2) sua educação e treinamento como escriba, e (3) sua confiabilidade como autor. (1 Néfi 1:1-3).
Contudo, Néfi não foi o único autor do Livro de Mórmon a usar colofões. Enos (Enos 1:1-2) e Mórmon (Mórmon 1:1) começaram seus registros com um colofão, enquanto Jacó (Jacó 7:27) incluiu um colofão no final de seu registro. Mórmon também usou colofões em todo o seu resumo com o intuito de introduzir citações literais, ou quase literais, de diversos textos de origem.
Alma 5, por exemplo, é precedida por um colofão introdutório: "Palavras que Alma, sumo sacerdote segundo a santa ordem de Deus, transmitiu ao povo nas suas cidades e povoados por toda a terra". Da mesma forma, as profecias feitas por Samuel, o lamanita, aos nefitas, registradas em Helamã 7-16 são introduzidas com um simples colofão identificando o autor do texto (Samuel) e um breve resumo de seu conteúdo.3
O uso de colofões para sinalizar o início ou o fim de um texto é amplamente encontrado em fontes bíblicas, egípcias e mesopotâmicas. Os livros proféticos da Bíblia começam geralmente com colofões, que identificam o profeta e introduzem brevemente o contexto histórico em que foi profetizado. Por exemplo, o livro de Isaías começa: "Visão de Isaías, filho de Amós, que ele teve a respeito de Judá e Jerusalém, nos dias de Uzias, Jotão, Acaz, e Ezequias, reis de Judá" (Isaías 1:1).4
Às vezes, os colofões bíblicos descrevem as profecias como vindas literalmente "pela mão" (bĕ yad) do profeta (cf. Malaquias 1:1; Ageu 1:1), uma característica compartilhada nos textos da Mesopotâmia para identificar o copista ("pela mão de tal e tal") e em textos egípcios posteriores para indicar autoria ("escrito de [sua] própria mão"; cf. 1 Néfi 1:3).5
Conforme foi descrito por Nibley, o colofão inicial do registro de Néfi exibe notáveis semelhanças com o colofão presente em um antigo manuscrito egípcio denominado "Papiro Bremner-Rhind".6 Outras semelhanças com textos egípcios poderiam ser citadas. De fato, era comum que textos literários egípcios terminassem com um colofão curto e formulaico, que certifica que o texto foi copiado corretamente, ou um colofão mais longo que também inclui a identidade do escriba.7 Era comum que os prefácios a textos literários egípcios também incluíssem o nome e os títulos do autor ou do tema da narrativa.8 Essas e outras considerações levaram Nibley a concluir que o tipo de colofão visto em 1 Néfi 1:1-3 é "altamente característico das composições egípcias".9
O porquê
Néfi disse que escreveu seu registro "na língua de [seu] pai, que consiste no conhecimento dos judeus e na língua dos egípcios" (1 Néfi 1:2). Sendo este o caso, é razoável esperar que seus escritos tenham as marcas da antiga literatura egípcia-judaica. A maneira como Néfi usa os colofões, cumpre essa expectativa notavelmente bem. Devido a evidências claras, indisponíveis na época de Joseph Smith, da influência egípcia na cultura literária e escrita judaica, que precedeu e coincidiu com a época de Néfi,10 isso confere credibilidade histórica do livro.
Além disso, aprender a identificar colofões pode auxiliar os leitores na compreensão das narrativas complexas do Livro de Mórmon. Isso ocorre porque os colofões eram inseridos em pontos estratégicos no texto para ajudar os leitores a identificar quando determinadas fontes estão sendo citadas ou quando vozes autorais estão mudando de uma para outra (como a de Mórmon para a de Alma em Alma 5). Como o estudioso Santo dos Últimos Dias John A. Tvedtnes explicou, os colofões "fornecem pistas valiosas sobre o processo de escrita e compilação [do Livro de Mórmon]".11
A presença de colofões no Livro de Mórmon constitui uma evidência convincente dos "grandes esforços empreendidos por seus autores e editores para tornar o registro o mais claro possível."12 Como alguém cuja alma "se deleita em esclarecer" (2 Néfi 25:4), é completamente compreensível que Néfi tenha utilizado colofões em seu registro, e que seus descendentes proféticos e escribas tenham seguido o mesmo padrão
Leitura Complementar
Hugh Nibley, Lehi in the Desert/The World of the Jaredites/There Were Jaredites (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1988), pp. 17–19. John A. Tvedtnes, "Colophons in the Book of Mormon", em Rediscovering the Book of Mormon: Insights You May Have Missed Before, ed. John L. Sorenson e Melvin J. Thorne (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1991), pp.32–37. John A. Tvedtnes, "Colophons in the Book of Mormon", em Reexploring the Book of Mormon: A Decade of New Research, ed. John W. Welch (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1992), pp. 13–16. Thomas W. Mackay, "Mormon as Editor: A Study of Colophons, Headers, and Source Indicators", Journal of Book of Mormon Studies 2, no. 2 (1993): pp. 90–109. John A. Tvedtnes e David E. Bokovoy, "Colophons and Superscripts", em Testaments: Links Between the Book of Mormon and the Hebrew Bible (Toelle, UT: Heritage Press, 2003), pp. 107–116.1. Hugh Nibley, Lehi in the Desert/The World of the Jaredites/There Were Jaredites (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1988), pp. 17–19. 2. Csaba Barlogh, The Stele of YHWH in Egypt: The Prophecies of Isaiah 18–20 concerning Egypt and Kush (Leiden: Brill, 2011), p. 69. Compare essa definição com a de Leila Avrin, Scribes, Script, and Books: The Book Arts from Antiquity to the Renaissance (Chicago e London: American Library Association e The British Library, 1991), p. 79. "A tradição do colofão […] floresceu na antiga Mesopotâmia e no Egito. A informação e a composição do colofão variavam. Dava o título padrão, ou seja, as palavras iniciais do livro, e o nome do escriba, às vezes com seu patronímico (o qual é o nome pessoal dado pela linhagem do autor). Raramente o autor do livro era nomeado. Às vezes, o colofão verificava que sua edição era uma cópia fiel do livro original, dando o nome do escriba do protótipo, sua data e proprietário. Em seguida, a data da cópia seria dada juntamente com o nome do patrono que encomendou o livro e a natureza do trabalho". 3. Ver este e outros exemplos identificados por John A. Tvedtnes, "Colophons in the Book of Mormon", em Rediscovering the Book of Mormon: Insights You May Have Missed Before, ed. John L. Sorenson e Melvin J. Thorne (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1991), pp. 32–37; "Colophons in the Book of Mormon", em Reexploring the Book of Mormon, ed. John W. Welch (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e FARMS, 1992), pp. 13–17; Thomas W. Mackay, "Mormon as Editor: A Study of Colophons, Headers, and Source Indicators", Journal of Book of Mormon Studies 2, no. 2 (1993): pp. 90-109; John A. Tvedtnes e David E. Bokovoy, "Colophons and Superscripts", em Testaments: Links Between the Book of Mormon and the Hebrew Bible (Toelle, UT: Heritage Press, 2003), pp. 107–116. 4. Ver também Jeremias 1:1–3; Amós 1:1; Miquéias 1:1; Sofonias 1:1. 5. Karel van der Toorn, Scribal Culture and the Making of the Hebrew Bible (Cambridge, MA: Harvard University Press, 2007), p. 32; John Gee, "Were Egyptian Texts Divinely Written?" em Proceedings of the Ninth International Congress of Egyptologists, Orientalia Levaniensia Analecta 150 (Leuvens: Peeters, 2007), 1: p. 809. Sobre colofões bíblicos em geral, ver H. M. I. Gervaryahu, "Biblical Colophons: A Source for the ‘Biography’ of Authors, Texts and Books", em Congress Volume Edinburgh, VTSup 28 (Leiden: Brill, 1975), pp. 42–59; D. W. Baker, "Biblical Colophons: Gevaryahu and Beyond", em Studies in the Succession Narrative: OTWSA 27 (1984) e OTWSA 28 (1985), ed. W. C. van Wyk (Pretoria: OTWSA, 1986), pp. 29–61; Michael Fishbane, "Biblical Colophons, Textual Criticism and Legal Analogies", Catholic Biblical Quarterly 42, no. 4 (1980): pp. 438–449; Tvedtnes e Bokovoy, "Colophons and Superscripts", pp. 109–114. 6. Nibley, Lehi in the Desert, p. 17. A autoridade citada por Nibley (Raymond O. Faulkner, "The Bremner-Rhind Papyrus", JEA 23 [1937]: p. 10) indica que, "estritamente falando", chamar a abertura do texto de colofão, neste caso, é um "termo inadequado", uma vez que o próprio colofão parece ser uma adição posterior ao manuscrito e não uma composição original. No entanto, Faulkner permite que ele seja chamado de "colofão" em um sentido amplo. Comparando as opiniões de Faulkner com as de Mark Smith, este último não vê impropriedade em chamar as linhas finais do manuscrito de colofão, mesmo que tenham sido acrescentadas após o restante do texto. Ver Mark Smith, Traversing Eternity: Texts for the Afterlife from Ptolemaic and Roman Egypt (New York, NY: Oxford University Press, 2009), pp. 120–121. 7. O colofão formulaico mais comum afirma que o texto "está finalizado desde o início até o fim, conforme encontrado na escrita", ou simplesmente "está finalizado". Em P. Leningrado 1115 (o Conto do Náufrago), o colofão inclui o nome do escriba: "está finalizado desde o início até o fim, conforme encontrado na escrita. O escriba, hábil em seus dedos, Imeni, filho de Imena." Consulte os exemplos coletados e discutidos em Michela Luiselli, "Os Colofões como Indicação das Atitudes em Relação à Tradição Literária no Egito e na Mesopotâmia", em Basel Egyptology Prize 1: Junior Research in Egyptian History, Archaeology, and Philology, ed. Susanne Bickel e Antonio Loprieno (Basel: Schwabe & Co., 2003), pp. 346–347. 8. Assim, as primeiras linhas da venerável história de Sinuhe. "O nobre de sangue e comandante, guardião e oficial distrital dos estados das terras soberanas asiáticas, ao serviço do soberano, este verdadeiro e estimado confidente real, o seguidor Sinuhe, disse: Eu era um fiel seguidor de meu senhor, um servo no harém do rei e da princesa hereditária, a mais elogiada, esposa de [Rei] Senwosret em Khnumet-sut e filha de [Rei] Amenemhet em Ka-nofru, Nofru, detentora de um estado honrado". William K. Simpson, "The Story of Sinuhe", em The Literature of Ancient Egypt: An Anthology of Stories, Instructions, Stelae, Autobiographies, and Poetry, ed. William Kelly Simpson, 3ª ed. (New Haven, CT: Yale University Press, 2003), p. 55. 9. Nibley, Lehi in the Desert, p. 17. 10. Ver geralmente Adolf Erman, "Eine ägyptische Quelle der »Sprüche Salomos«", Sitzungsberichte der preussischen Akademie der Wissenschaften 15 (1924): pp. 86–93; D. C. Simpson, "The Hebrew Book of Proverbs and the Teachings of Amenophis", Journal of Egyptian Archaeology 12, no. 3/4 (Out. 1926): pp. 232–239; Ronald J. Williams, "Some Egyptianisms in the Old Testament", em Studies in Honor of John A. Wilson, ed. E. B. Hauser, Studies in Ancient Oriental Civilization 35 (Chicago, IL: The University of Chicago Press, 1969), pp. 93–98; "'A People Come Out of Egypt': An Egyptologist looks at the Old Testament", em Congress Volume Edinburgh, pp. 231–252; Glendon E. Bryce, A Legacy of Wisdom: The Egyptian Contribution to the Wisdom of Israel (Lewisburg: Bucknell University, 1979). Orly Goldwasser, "An Egyptian Scribe from Lachish and the Hieratic Tradition of the Hebrew Kingdoms", Tel Aviv 18 (1991): pp. 248–253; David Calabro, "The Hieratic Scribal Tradition in Preexilic Judah", em Evolving Egypt: Innovation, Appropriation, and Reinterpretation in Ancient Egypt, BAR International Series 2397, ed. Kerry Muhlestein e John Gee (Oxford, Eng.: Archaeopress, 2012), pp. 77–85. Para informações sobre a formação de Néfi como escri, incluindo seu conhecimento do egípcio, ver Brant A. Gardner, "Nephi as Scribe", Mormon Studies Review 23, no. 1 (2011): pp. 45–55. 11. John A. Tvedtnes, "Colophons in the Book of Mormon", em Rediscovering the Book of Mormon, p. 37. Além disso, "o grande número dessas declarações em relações complexas tanto entre si quanto na estrutura geral do livro nos ensina outra coisa. Elas deixam claro que vieram de escritores antigos, e não de Joseph Smith".12. Tvedtnes, "Colophons in the Book of Mormon", em Reexploring the Book of Mormon, p. 16.