KnoWhy #98 | Maio 2, 2017

Por que os lamanitas romperam o tratado com o rei Lími?

Postagem contribuída por

 

Scripture Central

“Não seriam eles os que roubaram as filhas dos lamanitas?”

O conhecimento

Após o martírio de Abinádi 1 e Alma, o pai, conseguir escapar para o deserto, os lamanitas foram vistos novamente nas fronteiras da terra de Néfi (Mosias 19:6). Enquanto o rei Noé fugia com muitos de seus homens (19:11), alguns permaneceram com suas esposas e fizeram um convênio com os lamanitas, concordando em pagar "metade de tudo que possuíam" (19:15) para permanecer em suas terras. Entretanto, o rei Noé foi "morto pelo fogo" por alguns de seus homens, que agora queriam retornar às suas esposas na terra de Néfi (19:20). Os sacerdotes de Noé, no entanto, fugiram (19:21) e logo depois sequestraram 24 moças lamanitas "e levaram-nas para o deserto" (Mosias 20:5). O sequestro dessas "filhas dos lamanitas" (20:1) foi evidentemente tão ultrajante que seu súbito desaparecimento levou a ruptura imediata do convênio estabelecido entre os lamanitas e os recém-conquistados súditos nefitas (Mosias 19:25-29).

A violação foi tão grave que trouxe retaliação militar contra os nefitas, com os lamanitas lançando um ataque ao povo de Lími em sua capital, a cidade de Néfi (Mosias 20:6-11),2 pois os lamanitas presumiram que eles estavam envolvidos no desaparecimento de suas filhas. Comentando esta passagem, S. Kent Brown observou: "A decisão do rei [lamanita] de destruir a colônia nefita foi provavelmente baseada em uma combinação de considerações, sendo uma delas seu sentimento de raiva."3

Os leitores compreendem a raiva dos lamanitas. Além de suas filhas serem vítimas de um crime sexual, os súditos conquistados pareciam ter se levantado em rebelião. No mundo antigo, inclusive na antiga Israel, os juramentos, tratados [e convênios] tinham tamanha importância que a violação de um pacto poderia literalmente se tornar uma questão de vida ou morte. Como a quebra de um convênio feito em nome de Deus era vista como nada menos do que uma blasfêmia, esses juramentos ou pactos eram frequentemente acompanhados de ameaças de maldições divinas e temporais (inclusive a morte) se fossem quebrados (cf. Êxodo 20:7; Deuteronômio 30:15-20; Rute 1:16-17; 1 Samuel 20:13; Jeremias 34:18-20; Zacarias 5:1-4; Daniel 9:11).4

Na verdade, a expressão "fazer um convênio" no hebraico bíblico, é literalmente "cortar um convênio" (kārat berît) e, normalmente, "animais eram sacrificados ou cortados durante as antigas cerimônias de convênio do Oriente Próximo, a fim de demonstrar graficamente a penalidade a seus participantes caso não cumprissem o estipulado sob juramento" (cf. Gênesis 15:7–21).5

Isso explica por que os lamanitas reagiram com tanta veemência ao que pensavam ter sido a quebra de um juramento. De fato, "enviaram seus exércitos contra eles; sim, o próprio rei marchou à frente de seu povo; e subiram à terra de Néfi para destruir o povo de Lími" (Mosias 20:7). Como S. Kent Brown explica:

Em geral, quando um convênio era evidentemente quebrado, a questão era: "Quão flagrante seria a violação para que o soberano legitimamente reunisse suas forças militares e atacasse o vassalo recalcitrante?" O rei lamanita certamente enxergou uma série de crimes no rapto dessas moças. Em primeiro lugar, foi um sequestro, uma clara violação da lei; não havia um conflito ou tensão civil. Em segundo lugar, qualquer casamento resultante deste crime seria, portanto, ilegal ou, no mínimo, hediondo. Terceiro, o sequestro era evidência, segundo sua percepção, da quebra de juramentos solenes feitos apenas dois anos antes. Aparentemente, ele não teria outra escolha a não ser lançar a força do exército lamanita sobre os colonos nefitas. 6

É evidente que os sacerdotes de Noé cometeram um crime premeditado em Mosias 20:4, que registra que eles "ocultaram-se para observá-las" antes do sequestro. "A expressão hebraica traduzida como 'observá-las' indica, em geral, premeditação e planejamento, o que implica que os sacerdotes podiam muito bem ter conhecimento desse lugar e do costume das moças de ficarem ali."7 As evidências textuais do Livro de Mórmon apontam, portanto, para algo mais hediondo do que um mero ato de luxúria cometido no calor do momento, o que explica a severidade da resposta lamanita.

O porquê

Essa história talvez tenha sido incluída no Livro de Mórmon por vários motivos. Ela estabelece relatos posteriores sobre os sacerdotes de Noé e seus descendentes (Alma 25:4, 12; 43:13). Ao compreender a origem desses descendentes (das moças lamanitas capturadas), o restante do relato de Mórmon sobre as guerras entre nefitas e lamanitas faz mais sentido.

Ele também dá aos leitores um vislumbre do papel das mulheres no Livro de Mórmon. As mulheres não são muito mencionadas no Livro de Mórmon, mas quando são, elas são retratadas como sendo mais do que apenas objetos da narrativa. Elas desempenham um papel ativo e importante na narrativa.8 Isso é visto, por exemplo, na maneira como as filhas lamanitas sequestradas mais tarde imploraram pela vida de seus captores (que são chamados de "seus maridos"), revelando a complexa dinâmica do relacionamento desses personagens (Mosias 23:31-35).

Por fim, mostra como o Livro de Mórmon está firmemente enraizado na cultura bíblica. Até mesmo os lamanitas parecem ter preservado essa parte honrosa de sua herança cultural. A drástica reação dos lamanitas a um juramento considerado quebrado é perfeitamente lógica diante das práticas culturais bíblicas do ato de fazer um convênio.

Leitura Complementar

S. Kent Brown, "Marriage and Treaty in the Book of Mormon", em From Jerusalem to Zarahemla: Literary and Historical Studies of the Book of Mormon (Provo, UT: Religious Studies Center, Brigham Young University, 1998), pp. 99–112. Donna Lee Bowen e Camille S. Williams, "Women in the Book of Mormon", em The Encyclopedia of Mormonism, ed. Daniel H. Ludlow (New York, NY: Macmillan, 1992), 4: pp. 1577–1580. John W. Welch, Robert F. Smith e Gordon C. Thomasson, "Dancing Maidens and the Fifteenth of Av", em Reexploring the Book of Mormon: A Decade of New Research, ed. John W. Welch (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book and FARMS, 1992), pp. 139–142.

1. Central do Livro de Mórmon: "Por que Abinádi foi flagelado com tochas? (Mosias 17:13)", KnoWhy 96 (29 de abril de 2017). 2. S. Kent Brown, "Marriage and Treaty in the Book of Mormon", em From Jerusalem to Zarahemla: Literary and Historical Studies of the Book of Mormon (Provo, UT: Religious Studies Center, Brigham Young University, 1998), p. 100. 3. Brown, "Marriage and Treaty in the Book of Mormon", p. 103. 4. Menachem Elon, "Oath", em Encyclopedia Judaica; Bernhard W. Anderson, "Covenant", em The Oxford Companion to the Bible, ed. Bruce M. Metzger e Michael D. Coogan (New York, NY: Oxford University Press, 1993), pp. 138–139; James McKeown, Ruth, The Two Horizons Old Testament Commentary (Grand Rapids, MI: William B. Eerdmans, 2015), p. 28. 5. Matthew B. Brown, The Gate of Heaven: Insights on the Doctrines and Symbols of the Temple (American Fork, UT: Covenant Communications, 1999), p. 123; Jared T. Parker, "Cutting Covenants", em The Gospel of Jesus Christ in the Old Testament, ed. D. Kelly Ogden et al. (Provo, UT and Salt Lake City, UT: Religious Studies Center, Brigham Young University, and Deseret Book, 2009). 6. Brown, "Marriage and Treaty in the Book of Mormon", 103. 7. John W. Welch, Robert F. Smith, and Gordon C. Thomasson, "Dancing Maidens and the Fifteenth of Av", em Reexploring the Book of Mormon: A Decade of New Research, ed. John W. Welch (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book and FARMS, 1992), p. 140. 8. Donna Lee Bowen and Camille S. Williams, "Women in the Book of Mormon", em The Encyclopedia of Mormonism, ed. Daniel H. Ludlow, 4 v. (Nova York, NY: Macmillan, 1992) 4: pp. 1577–1580.

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