KnoWhy #445 | Outubro 22, 2018
Qual a importância do nome Néfi?
Postagem contribuída por
Scripture Central

"Eu, Néfi, tendo nascido de bons pais, recebi, portanto, alguma instrução em todo o conhecimento de meu pai; e tendo passado muitas aflições no decurso de meus dias, fui, não obstante, altamente favorecido pelo Senhor em todos os meus dias; sim, havendo adquirido um grande conhecimento da bondade e dos mistérios de Deus, faço, por isso, um registro de meus feitos durante minha vida." 1 Néfi 1:1
O conhecimento
"Eu, Néfi, tendo nascido de bons pais…" (1 Néfi 1:1).1 Esta frase de abertura, tão familiar aos estudiosos dedicados do Livro de Mórmon, pode ser citada palavra por palavra por muitos de seus leitores. No entanto, o que frequentemente passa despercebido é que a introdução de Néfi inclui um jogo de palavras com seu próprio nome. O nome Néfi, é provavelmente derivado de uma palavra egípcia (nfr) que significa ''bom'', ''belo'', ''formoso'' ou ''justo''.2 Na época de Néfi e Leí, era pronunciado como ''nih-fi, neé-fi ou nu-fi''.3
A declaração de Néfi de que nasceu de ''bons'' pais não é o único uso da palavra bom em suas palavras iniciais. Ele também mencionou que tinha ''um grande conhecimento da bondade e dos mistérios de Deus'' (1 Néfi 1:1). Em inglês, a palavra para ''bom'' é good e ''bondade'' é goodness. [A conexão não é tão evidente, mas em português, vemos a mesma raiz nas palavras "bom" e "bondade".] Isso parece sugerir que Néfi estava atribuindo qualquer bondade própria, implícita em seu nome, a seus pais terrenos e ao Pai Celestial.
Os comentários finais de Néfi, em 2 Néfi 33, refletem a ênfase de sua introdução na bondade. Ele disse que suas palavras "persuadem [seu povo] a fazer o bem" (v. 4) e que eles "ensinam a todos os homens que devem fazer o bem" (v. 10). Essas declarações afirmam que Néfi cumpriu o mandamento que o Senhor lhe deu em 2 Néfi 5:30: ''[E] gravarás nelas muitas coisas que são boas a meus olhos, para proveito de teu povo''. [Em inglês, a passagem reforça o uso de "bom" (good).] Por fim, Néfi advertiu que suas palavras condenariam aqueles que ''não participa[m] da bondade de Deus'' (2 Néfi 33:14), o que, é claro, reflete sua descrição da ''bondade'' de Deus em 1 Néfi 1:1.4
A tripla repetição de um termo relacionado ao conceito de ser bom, no início e no final do registro de Néfi, de fato, fornece evidências de um jogo de palavras intencional.5 O caso é reforçado ainda mais pelo fato de que outros autores do Livro de Mórmon perceberam a introdução inteligente de Néfi e imitaram o uso de trocadilhos em suas próprias declarações iniciais.
Por exemplo, Enos introduziu seu breve livro escrevendo: ''[E]u, Enos, sabia que meu pai era um homem justo— pois instruiu-me em seu idioma e também nos preceitos e na admoestação do Senhor — e bendito seja o nome de meu Deus por isso'' (Enos 1:1). Assim como Néfi, Enos mencionou (1) que seu pai era justo, (2) que foi ensinado na língua de seu pai, e (3) louvou a Deus. Em hebraico, o nome Enos significa ''homem''.6 Portanto, ao referir-se a seu pai como um ''homem justo'', Enos associou seu próprio nome à retidão de seu pai, assim como Néfi. Exemplos semelhantes de jogos de palavras introdutórios podem ser encontrados nos nomes Benjamin, Abis, Alma e Zênife.7
Outra linha de evidência vem de uma declaração feita por Helamã, filho de Helamã, a seus filhos, Néfi e Leí. Helamã disse que lhes deu os nomes de seus "primeiros pais" para que
''[...] quando vos lembrardes deles, vos lembreis de suas obras; e quando vos lembrardes de suas obras, saibais que foi dito e também escrito que elas foram boas. Portanto, meus filhos, desejo que pratiqueis o bem, a fim de que possa ser dito de vós e também escrito o mesmo que foi dito e escrito sobre eles''. (Helamã 5:6–7)
Esse comentário é obviamente válido para o Pai Leí,8 a quem Néfi descreveu como ''bom'' (1 Néfi 1:1). Contudo, funciona especialmente bem se o nome Néfi for derivado de uma palavra que significa literalmente ''bom''. Ao nomear seus filhos em homenagem aos primeiros pais, Helamã contribuiu para assegurar que o bom nome e as boas obras de Néfi fossem perpetuados por seus descendentes.9
Na verdade, talvez seja importante lembrar que o termo nefitas vem do próprio nome de Néfi. Lembrando que a palavra egípcia (nfr) da qual o nome de Néfi é provavelmente derivado também pode significar ''justo'', é notável que em inglês (tradução inspirada de Joseph Smith) ele usa a palavra fair (''justo'') quando em português os nefitas se referem ao povo como ''belos''. Se substituirmos essa palavra por ''justo'', como Joseph Smith a traduziu, vemos que o termo é repetido novamente. Por exemplo, quando os lamanitas justos se converteram ao Senhor, ''seus filhos e suas filhas tornaram-se sumamente [justos], e foram contados com os nefitas, sendo chamados de nefitas'' (3 Néfi 2:16). É ainda mais notório que Mórmon se referiu aos nefitas como sendo ''formosos'' (ou seus sinônimos "belos" e ''justos'') em quatro ocasiões, ao lamentar sua destruição:
Ó vos, formosos, como pudestes vos apartar dos caminhos do Senhor? Ó vos, formosos, como pudestes rejeitar aquele Jesus que estava de braços abertos para vos receber? […] Ó vos, belos filhos e filhas, vós, pais e mães, vós, maridos e mulheres, vos, formosos, como pudestes cair? (Mórmon 6:17, 19).10
Em geral, essas evidências textuais demonstram persuasivamente que os autores do Livro de Mórmon associaram o nome Néfi ao que é ''bom'' e ''justo'' (fair em inglês, e ''formoso'' ou "belo" em português). A declaração de Néfi de que ele usou a língua egípcia para escrever seu registro revela a possibilidade de que seja um jogo de palavras egípcio.11
O porquê
Entre os pesquisadores, é amplamente aceito que os antigos escritores hebraicos usavam extensivamente várias formas de jogo de palavras em seus escritos.12 Eles se preocupavam com nomes e seus significados e quando a oportunidade se apresentava, relacionavam criativamente nomes a importantes temas narrativos. No caso de Néfi, ele parece ter usado seu próprio nome para enfatizar o quão bom eram seus pais, seu Deus e seu registro, ao qual descreveu como contendo as ''palavras de Cristo'' (2 Néfi 33:10-11).
Acima de tudo, Néfi esperava que suas palavras persuadissem seu povo e a todos os homens a ''fazer o bem'', assim como ele mesmo havia feito (2 Néfi 33:4, 10). Esses temas contribuem para estabelecer o registro de Néfi — e, por extensão, todo o Livro de Mórmon — como um bom livro, semelhante à Bíblia.13
A importância dos nomes entre os profetas do Livro de Mórmon também pode nos ajudar a reconhecer o significado de tomar sobre nós o nome de Cristo. Helamã deu o nome de Néfi e Leí a seus filhos para que, quando refletissem sobre seus próprios nomes, tivessem o desejo de fazer ''o bem'' (Helamã 5:7). Da mesma forma, no batismo, somos ordenados a tomar sobre nós o nome de Cristo.14 Isso pode nos ajudar a lembrar das coisas que Cristo fez e a fazer as obras que Ele faria.15
Por fim, é importante notar que Joseph Smith iniciou seus estudos de hebraico vários anos após a tradução do Livro de Mórmon.16 E nunca recebeu treinamento formal na língua egípcia.17 Nesse caso, é altamente improvável que, confiando apenas em sua própria sabedoria, ele soubesse sobre o uso generalizado de trocadilhos na Bíblia. Tampouco, é improvável que ele soubesse que o nome Néfi estaria relacionado a uma palavra egípcia que significa ''bom''. Portanto, a boa introdução de Néfi fornece boas evidências de que Joseph Smith era verdadeiramente um profeta de Deus. O que também ajuda a confirmar que Néfi era de fato um antigo profeta hebreu treinado no ''conhecimento dos judeus e na língua dos egípcios'' (1 Néfi 1:2).
Leitura Complementar
Matthew L. Bowen, "'O Ye Fair Ones' – Revisited", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 20 (2016): pp. 315–344. Matthew L. Bowen, "'He Is a Good Man': The Fulfillment of Helaman 5: pp. 6–7 in Helaman 8:7 and 11:18–19", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 17 (2016): pp. 167–168. Matthew L. Bowen, "Nephi's Good Inclusio", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 17 (2016): pp. 181–195. Noé G. Correa, "¿Aparte de la escritura judía y egipcia que Nefi aprendió de su padre Lehi que otras ciencias aprendió de él?", Central do Livro de Mórmon, 2018.1. Ao longo deste artigo, itálicos serão adicionados às escrituras citadas para enfatizar exemplos de jogo de palavras. 2. Ver Matthew L. Bowen, "Nephi's Good Inclusio", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 17 (2016): p. 182. Ver também Matthew L. Bowen, ''Internal Textual Evidence for the Egyptian Origin of Nephi’s Name'', Insights 22, no. 11 (2002): p. 2; John Gee, "Four Suggestions on the Origin of the Name Nephi", em Pressing Forward with the Book of Mormon: The FARMS Updates of the 1990’s, ed. John W. Welch e Melvin J. Thorne (Provo, UT: FARMS, 1999), pp. 1–5; John Gee, "Notes and Communications: A Note on the Name Nephi", Journal of Book of Mormon Studies 1, no. 1 (1992): pp. 189–191; Raymond O. Faulkner, A Concise Dictionary of Middle Egyptian (Oxford, UK: Griffith Institute, 1962), p. 131. 3. Bowen, "Nephi's Good Inclusio", p. 181. Como fonte para sua explicação, Bowen citou Gee, "A Note on the Name Néfi", pp. 189–191; Gee, "Four Suggestions on the Origin of the Name Néfi", pp. 1–5. 4. O simbolismo de Néfi parece ilustrar o sonho de seu pai, Leí, da Árvore da Vida. Nele, Leí convidou Lamã e Lemuel a virem à Árvore da Vida, mas eles ''não quiseram ter [com ele] e comer do fruto'' (1 Néfi 8:18). O que pode significar que Lamã e Lemuel decidiram por si não comerem do fruto. Isso fornece informações adicionais sobre a declaração de Néfi a respeito daqueles que ''não [querem] participam da bondade de Deus'' (2 Néfi 33:14). Por fim, ninguém é incapaz ou está proibido de participar da bondade de Deus (ver 2 Néfi 26:24-28), de modo que as únicas pessoas que, assim, não vêm a Cristo são aquelas que se recusam a fazê-lo. Ver Bowen, "Nephi's Good Inclusio", p. 186; Jennifer C. Lane, "The Presence of the Lord", em The Things Which My Father Saw: Approaches to Lehi's Dream and Nephi's Vision (2011 Sperry Symposium), ed. Daniel L. Belnap, Gaye Strathearn e Stanley A. Johnson (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e Religious Studies Center, Brigham Young University, 2011), p. 130. 5. A tripla repetição na introdução de Néfi inclui seu próprio nome. 6. Ver Bowen, "Nephi's Good Inclusio", pp. 187–188; Matthew L. Bowen, "'And There Wrestled a Man with Him' (Genesis 32:24): Enos's Adaptations of the Onomastic Wordplay of Genesis", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 10 (2014): pp. 151–160; Matthew L. Bowen " Wordplay on the Name Enos", Insights 26, no. 3 (2006): p. 2. Para mais um jogo de palavras no Livro de Enos, ver Matthew L. Bowen, '''I Kneeled Down Before My Maker': Allusions to Esau in the Book of Enos'', Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 27 (2017): pp. 29–56. 7. Ver Bowen, "Nephi's Good Inclusio", pp. 188–191. 8. Muito semelhante ao ''pai Abraão'' (ver Lucas 1:73; João 8:52; Atos 7:2; Romanos 4:12), Leí era visto como o pai que deu origem a seu povo e era continuamente identificado pelos profetas nefitas como o ''pai Leí'' (ver Mosias 1:4; Alma 9:9; Helamã 8:22; 3 Néfi 10:17). Consulte o artigo da Central do Livro de Mórmon, ''Por que existem sete tribos de Leí? (Jacó 1:13)", KnoWhy 319, (26 de fevereiro de 2018). 9. Ver Matthew L. Bowen, "'He Is a Good Man': The Fulfillment of Helaman 5:6–7 in Helaman 8:7 and 11:18–19", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 17 (2016): pp. 167–168. 10. Ver Matthew L. Bowen, "'O Ye Fair Ones' – Revisited", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 20 (2016): pp. 315–344; Matthew L. Bowen, " 'O Ye Fair Ones': An Additional Note on the Meaning of the Name Nephi", Insights 23, no. 6 (2003): pp. 2–3. 11. Embora nos dias de Néfi os israelitas tivessem escapado da escravidão egípcia, a política, a cultura e as conexões linguísticas entre essas duas sociedades nunca foram completamente cortadas. Como Néfi, os autores bíblicos por vezes usavam palavras egípcias para fazer jogo de palavras, mesmo quando escreviam em hebraico. Ver Gary A. Rendsburg, "Word Play in Biblical Hebrew: An Eclectic Collection", em Puns and Pundits: Word Play in the Hebrew Bible and Ancient Near Eastern Literature, ed. Scott B. Noegel (Bethesda, Maryland: CDL Press, 2000), pp. 137–162. 12. Ver Arthur Keefer, "Phonological Patterns in the Hebrew Bible: A Century of Studies in Sound", Currents in Biblical Research 15, no. 1 (2016): pp. 41–64. 13. Ver Bowen, “'O Ye Fair Ones' – Revisited'', pp. 315–344; Gordon B. Hinckley, ''Mórmon deveria significar 'muito bom'", A Liahona, janeiro de 1991, disponível em lds.org. 14. Ver Richard O. Cowan, ''The Church Shall Bear My Name and Be Built upon My Gospel'', em 3 Néfi 9–30, This Is My Gospel, Book of Mormon Symposium Series, Volume 8, ed. Mount S. Nyman e Charles D. Tate (Provo, UT: Religious Studies Center, Brigham Young University, 1993), pp. 225–228. 15. Ver Dallin H. Oaks, ''Tomar sobre si o nome de Jesus Cristo'', A Liahona, julho de 1985, disponível em lds.org. 16. Joseph Smith traduziu o Livro de Mórmon em 1829 e não há evidências de que tenha recebido qualquer instrução em hebraico até 1835. Ver Matthew J. Grey, "'The Word of the Lord in the Original': Joseph Smith's Study of Hebrew in Kirtland'', em Approaching Antiquity: Joseph Smith and the Ancient World, ed. Lincoln H. Blumell, Matthew J. Grey e Andrew H. Hedges (Salt Lake City e Provo, UT: Deseret Book e Religious Studies Center, Brigham Young University, 2015), pp. 253–255; Louis Zucker, ''Joseph Smith as a Student of Hebrew'', Dialogue: A Journal of Mormon Thought 3, no. 2 (1968): pp. 41–55. 17. Para saber mais sobre o que se sabia sobre o antigo Egito nos dias de Joseph Smith, ver John Gee, ''Joseph Smith and Ancient Egypt'', em Approaching Antiquity, pp. 427–448.