KnoWhy #232 | Agosto 21, 2019

Qual foi a reação de Mórmon ao ver seu povo ser exterminado?

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Scripture Central

"Ó vós, formosos, como pudestes vos apartar dos caminhos do Senhor?" Mórmon 6:17

O conhecimento

"Ó vós formosos!" lamentou Mórmon enquanto refletia sobre a destruição de seu povo. "[C]omo pudestes vos apartar dos caminhos do Senhor! [...] Como pudestes rejeitar aquele Jesus que estava de braços abertos para vos receber? Eis que", lamentou ele, "se não tivésseis feito isto, não teríeis caído. Eis, porem, que caístes e eu choro vossa perda." (Mórmon 6:17-18).

A alma de Mórmon "estava despedaçada de angústia" ao ser testemunha da "causa da morte de [seu] povo" (Mórmon 6:16). Essa angústia se espalha pelas páginas quando lemos seu triste lamento.

Ó vós, belos

filhos e filhas,

vós, pais e mães,

vós, maridos e mulheres,

vós formosos,

como pudestes cair?

Eis, porém, que partistes;

e meus lamentos não vos podem trazer de volta. (Mórmon 6:19-20)

Talvez porque o luto pela perda de um ente querido esteja entre os aspectos mais universais da experiência humana, os lamentos estão entre as formas mais antigas de literatura do mundo, que remontam pelo menos ao terceiro milênio a.C.1 "Desde a antiga Suméria", escreveu Nancy C. Lee, professora de estudos religiosos, "os lamentos de poetas e cantores ainda ressoam com a agonia daqueles que hoje sofrem com a guerra e as privações".2

O mesmo poderia ser dito das lamentações de Jeremias sobre a queda de Jerusalém e seu povo para os babilônios em 586 a.C. (Lamentações). Ou séculos depois, quando o Salvador também lamentou a relutância da cidade em seguir o Senhor (Mateus 23:37; Lucas 13:34)3

No antigo Oriente Próximo, as lamentações fúnebres "são tipicamente caracterizadas por frases curtas [exclamatórias] como 'Ó, meu filho!'"4 Não muito diferente do lamento doloroso de Mórmon: Ó vós, belos! Nas antigas lamentações fúnebres, essa exclamação é seguida por "passagens narrativas que contrastam o passado gloriosamente representado do falecido com o triste presente"5 , assim como Mórmon fez:

"Como pudestes vos apartar dos caminhos do Senhor? [...] como pudestes rejeitar aquele Jesus que estava de braços abertos para vos receber? [...] Eis que, se não tivésseis feito isto, não teríeis caído." (Mórmon 6:17-18).

Ao escrever essas palavras, Mórmon provavelmente estava imaginando a gloriosa era de paz e prosperidade iniciada pela visita pessoal do Senhor ressuscitado, sobre a qual ele havia lido no registro nefita. Esse forte contraste, sem dúvida, contribuiu para o trágico aguilhão da morte que o cercava.

Os poetas antigos também aplicavam as formas de lamentações fúnebres a cidades inteiras, "como se a cidade fosse uma pessoa falecida".6 Jeremias fez isso enquanto lamentava a destruição de Jerusalém da qual Leí havia fugido (Lamentações). Séculos depois, o Salvador também lamentaria: "Jerusalém, Jerusalém!" (Mateus 23:37; Lucas 13:34)

De modo semelhante, Mórmon aplicou seu lamento não apenas à destruição de uma cidade inteira, mas ao genocídio de seu povo. Assim como os lamentos de Jesus, Jeremias e outros poetas e profetas da antiguidade, o lamento de Mórmon evoca poderosamente a agonia e o sofrimento que os leitores de hoje podem facilmente sentir e se relacionar.

"Quando relevante", as lamentações fúnebres geralmente incluíam maldições "dirigidas aos responsáveis pela morte do falecido".7 Mórmon, no entanto, sabia que os nefitas eram culpados por sua própria destruição. E assim, ele concluiu com esse aviso perturbador:

E logo chegará o dia em que vossa mortalidade se revestirá de imortalidade,

e esses corpos que agora se decompõem em corrupção logo se tornarão corpos incorruptíveis;

e então tereis que vos apresentar perante o tribunal de Cristo, para serdes julgados de acordo com vossas obras;

e, se tiverdes sido justos,

sereis abençoados com vossos pais que partiram antes de vós.

Oh! Se vos tivésseis arrependido antes que esta grande destruição vos sobreviesse.

Eis, porém, que partistes;

e o Pai, sim, o Eterno Pai dos céus conhece vosso estado;

e ele procede para convosco segundo sua justiça e misericórdia. (Mórmon 6:21 -22).

Em vez de amaldiçoar os lamanitas, a quem ele poderia ter culpado pela morte de seu povo, Mórmon os convidou a se arrependerem e receberem o evangelho (Mórmon 7), a "abandonar [suas] armas de guerra e não mais vos deleitar com derramamento de sangue;" e "crer em Jesus Cristo, que ele é o Filho de Deus" (vv. 4-5).8

O porquê

A variação cuidadosa de Mórmon nas formas tradicionais de lamentação é importante.9 Ele não amaldiçoou os lamanitas, nem mesmo os culpou pela destruição de seu povo, embora tivesse sido fácil fazer isso. Em vez disso, ele reconheceu que seu povo tinha apenas a si mesmo e sua própria iniquidade para culpar. Ele então advertiu que eles logo estariam diante de Deus em julgamento, e esperou pelo melhor, confiando que Deus julgaria "segundo a sua justiça e misericórdia" (Mórmon 6:22). Quanto aos descendentes daqueles que eram seus inimigos (os lamanitas), ele os convidou a virem a Cristo.

Mórmon foi profundamente afetado pela tragédia da queda e destruição de seu povo. A carnificina que ele testemunhou é difícil de entender. O lamento de Mórmon não foi meramente pela perda de um ente querido, como a de um lamento fúnebre, mas sim pela perda de um povo, seu povo: os nefitas, o "povo formoso".10

Apesar de ter testemunhado o que foi, sem dúvida, emocional e psicologicamente traumático, Mórmon, em suas palavras finais, deu um exemplo digno a seguir. Seu povo era iníquo, mas ele os amava profundamente e lamentava muito por sua perda. Ele não procurou culpar os outros, apesar de sua dor, e amou seus inimigos, convidando-os a virem a Cristo e pôr fim ao desnecessário derramamento de sangue.

Os leitores de hoje podem aprender a amar de forma semelhante até mesmo aqueles que erram, aceitar a responsabilidade pessoal por suas próprias escolhas e as consequências dos julgamentos divinos. Em vez de culpar os outros, mesmo aqueles que choram podem encontrar conforto em amar seus inimigos, orar por aqueles que os usaram de forma desrespeitosa e convidá-los a virem a Cristo

Leitura complementar

Matthew L. Bowen, "‘O Ye Fair Ones’—Revisited", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 20 (2016): pp. 315–344.

Matthew L. Bowen,"'O Ye Fair Ones': An Additional Note on the Meaning of the Name Nephi", Insights: A Window on the Ancient World 23, no. 6 (2003): p. 2.

Thomas W. Mackay, "Mormon and the Destruction of Nephite Civilization (Mormon 3–9)", em Book of Mormon, Part 2: Alma 30 to Moroni, Studies in Scripture, Volume 8, ed. Kent P. Jackson (Salt Lake City, UT: Deseret Book, 1988), pp. 231–244.

  • 1. Ver F. W. Dobbs-Allsopp, "Lament", em Eerdmans Dictionary of the Bible, ed. David Noel Freedman (Grand Rapid, MI: Wm. B. Eerdmans, 2000), pp. 784–785.
  • 2. Nancy C. Lee, Lyrics of Lament: From Tragedy to Transformation (Minneapolis, MN: Fortress Press, 2010), p. 24.
  • 3. Para mais informações sobre lamentos bíblicos, ver Lee, Lyrics of Lament, pp. 73-179.
  • 4. Dobbs-Allsopp, "Lament", p. 784.
  • 5. Dobbs-Allsopp, "Lament", p. 785.
  • 6. Dobbs-Allsopp, "Lament", p. 785.
  • 7. Dobbs-Allsopp, "Lament", p. 785.
  • 8. Para uma revisão mais completa da forma que a literatura tradicional de lamentações assume, ver Lee, Lyrics of Lament, pp. 49–70.
  • 9. De acordo com Dobbs-Allsopp, "Lament", 785, "há várias transformações literárias" dos lamentos fúnebres padrão no Velho Testamento. Portanto, não é surpreendente ou problemático que Mórmon quebre a maneira como é feito.
  • 10. O nome nefita pode significar literalmente povo formoso. Ver Matthew L. Bowen, "‘O Ye Fair Ones’: An Additional Note on the Meaning of the Name Nephi," Insights: A Window on the Ancient World 23, no. 6 (2003): p. 2; Matthew L. Bowen, "'O Ye Fair Ones'—Revisited", Interpreter: A Journal of Mormon Scripture 20 (2016): pp. 315–344.