KnoWhy #29 | Fevereiro 6, 2017

Será que 2 Néfi 1:1 – 4:12 pode ser chamado de “Testamento de Leí”?

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Scripture Central

"E agora, meu filho mais jovem, José, a quem eu trouxe do deserto de minhas aflições, que o Senhor te abençoe para sempre, pois teus descendentes não serão completamente destruídos." 2 Néfi 3:3

O conhecimento

Após chegar à terra prometida, Néfi registra que seu pai, Leí, instruiu e abençoou sua posteridade pouco antes de morrer (2 Néfi 1:1; 4:12). A literatura primitiva dos judeus está repleta de muitos exemplos do que às vezes é chamado de literatura testamentária. Geralmente datam de 200 a.C. a 500 d.C. e seguem o padrão da última bênção e maldição que Jacó deu a seus filhos em Gênesis 49.

De acordo com James H. Charlesworth: "Os autores dos testamentos não aderiam a nenhum gênero literário, mas é possível discernir um formato semelhante entre eles". Nesse formato:

Leí abençoando
A figura principal enfrenta a morte [1] e faz com que seus parentes e amigos íntimos façam um círculo ao redor de sua cama. Ocasionalmente, ele os informa de seu erro fatal e [2] os exorta a evitar certas tentações; normalmente, [3] ele os instrui no caminho da justiça e [4] profere bênçãos e maldições. Muitas vezes, expõe suas palavras — como o vidente apocalíptico do fim apocalíptico — com [5] descrições do futuro, conforme revelado a ele em um sonho ou visão.1

Esse formato pode ser facilmente demonstrado em vários dos Testamentos dos Doze Patriarcas, que estão entre os primeiros exemplos da literatura testamentária.2

Por exemplo, temos o Testamento de José, atribuído a um dos doze patriarcas de Israel.

  1. A introdução diz: "Uma cópia do testamento de José. Quando estava prestes a morrer, ele chamou seus filhos e seus irmãos [...]" (1:1),3 e, em seguida, a partir disso, extensas instruções são dadas.
  2. O patriarca José conta, por fim, a história de quando resistiu à tentação da esposa de Potifar, ocasionalmente adicionando advertências e exortações específicas sobre o pecado (por exemplo, 7:8; 10:1–6).
  3. Sua narrativa também está entrelaçada com muitos exemplos de instruções de retidão, como seu conselho: "Em todo ato mantenham o temor de Deus diante de seus olhos e honrem seus irmãos" (11:1; cf. 2:4–7; 3:4; 4:3, 6; 9:3; 10:1–6; 11:1–7; 17:2–8).
  4. Ele também promete bênçãos, dizendo: "Se viverem segundo os mandamentos do Senhor, Deus o exaltará para sempre com coisas boas" (18:1, as bênçãos continuam ao longo de 18:1–4).
  5. Por fim, o testamento termina com uma profecia apocalíptica (19:1–11).

Esses pontos podem ser vistos, às vezes, sutilmente, em Gênesis 49.4 O mesmo formato também pode ser encontrado no testamento de Leí.

Jacó abençoando José e seus filhos, por Charles Foster Jacó Abençoando José e Seus Filhos, por Charles Foster

1. Reúne a família e amigos próximos pouco antes de sua morte. Néfi diz que Leí "lhes disse muitas coisas" a sua família e membros de seu grupo. O que inclui a Lamã, Lemuel e sua posteridade, Sam, os filhos de Ismael, Zorã, Néfi, Jacó e José (2 Néfi 1:1, 28; 2:1; 3:1; 4:1, 3, 9–11).

É claramente entendido em seus discursos que ele está prestes a morrer, pois muitas vezes ele fala que logo será posto "na fria e silenciosa sepultura" (2 Néfi 1:14; cf. 1:21; 2:30; 4:5). Néfi confirma: "depois de meu pai, Leí, ter falado a toda a sua casa [...] envelheceu. E […] morreu e foi sepultado" (2 Néfi 4:12).

2. Ele os exorta a evitar tentações. Leí ensina seus filhos mais velhos sobre "suas rebeliões quando estavam sobre as águas" (2 Néfi 1:2). Ele os convida a acordar "e sacud[ir] as pavorosas correntes que vos prendem" (2 Néfi 1:13) e "observar os estatutos e os juízos do Senhor" (2 Néfi 1:16). Ele os adverte das consequências de não guardarem os mandamentos (2 Néfi 1:20; 4:4). Ele aconselha toda a sua posteridade a não escolher a "morte eterna, conforme a vontade da carne" (2 Néfi 2:29).

3.Ele os instrui nos caminhos da justiça. Leí fala do Senhor, dizendo: "seus caminhos são retidão para sempre" (2 Néfi 1:19) e incentiva seus filhos a "cingi[r] a armadura da retidão" (2 Néfi 1:23). Ele lhes ensina o Plano da Salvação (2 Néfi 2) dizendo: "gostaria que confiásseis no grande Mediador e désseis ouvidos aos seus grandes mandamentos; e que fôsseis fiéis às suas palavras e escolhêsseis a vida eterna, conforme a vontade do seu Santo Espírito" (2 Néfi 2:28).

4. Profere bênçãos e maldições. Leí fala de bênçãos e maldições ao longo de seu discurso. Ele adverte Lamã e Lemuel sobre as maldições que cairão sobre eles se não guardarem os mandamentos (2 Néfi 1:18, 22) e deixa-lhes uma bênção condicional (2 Néfi 1:28–29). Também abençoa Zorã (2 Néfi 1:30–31), Jacó (2 Néfi 2:3-4) e José (2 Néfi 3:3,25). Aos filhos de Lamã e Lemuel, ele pronuncia uma bênção sobre eles enquanto amaldiçoa seus pais (2 Néfi 4:5–9).

5. Descrever o futuro segundo a revelação de um sonho ou visão. Leí começa dizendo: "tive uma visão, pela qual sei que Jerusalém foi destruída" (2 Néfi 1:4). Então, Leí profetiza sobre o futuro da terra prometida (2 Néfi 1:6–12). Ele também compartilha uma extensa profecia proferida por José do Egito, que descreve muitos eventos futuros (2 Néfi 3). De acordo com Leí:

José verdadeiramente viu nossos dias. E obteve a promessa do Senhor de que do fruto de seus lombos o Senhor Deus levantaria um ramo justo para a casa de Israel; não o Messias, mas um ramo que seria arrancado e, não obstante, seria lembrado nos convênios do Senhor de que o Messias lhes seria manifestado nos últimos dias, com o espírito de poder, a fim de tirá-los das trevas para a luz sim, das trevas ocultas e do cativeiro para a liberdade. (2 Néfi 3:5 ênfase adicionado)

Leí também diz que José profetizou sobre a restauração da casa de Israel (2 Néfi 3:13, 24).

Curiosamente, na versão armênia do Testamento de José, José supostamente diz que havia profetizado que uma parte de Israel "clamou ao Senhor, e o Senhor os levou a um lugar fértil e bem regado. Ele os tirou das trevas para a luz" (19:3). De lá, o patriarca vê a coligação de Israel (19:4–7). Como o registro de Leí, a versão grega do Testamento de José indica que José sabia da vinda do Messias, e o Messias não seria de sua posteridade, mas de Judá (19:8).

O porquê

Essa comparação é interessante por vários motivos. Primeiro, mostra que em algumas tradições judaicas antigas, era normal e esperava-se que o patriarca se reunisse com sua família para abençoar, instruir, exortar e profetizar a eles antes de morrer. Nesse sentido, Leí agiu como o esperado dele.5

Em segundo, apresenta Leí como o patriarca de um novo ramo de Israel. Embora não todos, muitos dos personagens da literatura testamentária são figuras patriarcais do passado de Israel. Ao representar Leí nessa função, Néfi está solidificando os leítas como um ramo independente de Israel. Esse foi um legado duradouro entre os povos do Livro de Mórmon. John W. Welch explicou:

Considerar Leí sob a tradição patriarcal vem do fato de que Leí foi lembrado pelos nefitas do começo ao fim como "Pai Leí" [...] Como Leí é a única pessoa no Livro de Mórmon chamada de "nosso pai", essa designação parece ser uma referência única à posição patriarcal de Leí à frente da civilização, sociedade e religião nefitas.6

Em terceiro lugar, é interessante que tanto no discurso de Leí quanto no Testamento de José, José parece profetizar que parte de Israel seria separada e levada para uma terra prometida, a coligação de Israel, e que o Messias viria da tribo de Judá. A profecia não pode ser rastreada até o tempo de Leí, muito menos até o de José do Egito. Entretanto, essa comparação mostra que algumas tradições antigas documentadas estão em consonância com o Livro de Mórmon.

Por fim, fornece um exemplo para os pais e patriarcas de hoje. A tradição, inicialmente, mas brevemente presente em Gênesis 49 , não foi mantida e desenvolvida apenas pelos judeus após seu retorno a Jerusalém no Período do Segundo Templo, mas foi ampla e efetivamente pronunciada por Leí no século VI a.C. A partir disso, os profetas pós-Leí do Livro de Mórmon seguiram o exemplo, como Alma fez em Alma 36-42 e Helamã em Helamã 5:5-13. Os pais santos dos últimos dias também podem seguir esses exemplos patriarcais quando abençoam, instruem, exortam e testificam a seus filhos e netos.

Leitura Complementar

John W. Welch,"Lehi's Last Will and Testament: A Legal Approach", em Second Nephi, The Doctrinal Structure, ed. Monte S. Nyman e Charles D. Tate Jr. (Provo, UT: BYU Religious Studies Center, 1989), pp. 61–82.

1. James H. Charlesworth, Introduction to Testaments Section, em The Old Testament Pseudepigrapha, 2 v., ed. James H. Charlesworth (Peabody, Mass.: Henrickson Publishers, 1983), 1: p. 773, colchetes adicionados. 2. Para obter informações e a tradução para o inglês ver, Testaments of the Twelve Patriarchs, ver H.C. Kee, "Testaments of the Twelve Patriarchs: A New Translation and Introduction", em The Old Testament Pseudepigrapha, 1: pp. 775–828. Todas as citações são desta edição e foram traduzidas pela BMC. 3. Todas as referências de capítulos e versículos vêm do Testamento de José. 4. Em Gênesis, Jacó (1) "chamou seus filhos" para se reunirem (49:1–2); (2) suas palavras a Rúben advertem contra a instabilidade (49:4), e suas palavras a Simeão e Levi condenam "violência", assassinato, fúria e ira (49:5–7); (3) ele fala de esperar pela salvação do Senhor (49:18) e suas palavras a José ilustram as bênçãos de se apoiar na força do "Valente de Jacó" e da "Pedra de Israel" (49:24); (4) a maior parte do capítulo contém bênçãos (49:8–13, 19–26, 28) e maldições (49:4, 7, 15); (5) todas as palavras a seus filhos são sobre vai "acontecer nos últimos dias" (49:1), mas as bênçãos para Judá (49:8–12) e José (49:22) são particularmente proféticas. 5. Embora a literatura testamentária seja de um período posterior à época de Leí, ela se origina, em última análise, em Gênesis 49, que poderia estar nas Placas de Latão. Tanto os nefitas quanto os judeus posteriores podem ter desenvolvido tradições do "testamento" de forma independente, usando Gênesis 49 como modelo. 6. John W. Welch, "Lehi's Last Will and Testament: A Legal Approach", em Second Nephi, The Doctrinal Structure, ed. Monte S. Nyman e Charles D. Tate Jr. (Provo, UT: Centro de Estudos Religiosos da BYU, 1989), pp. 69–70.

Patriarca
Livro de Mórmon