KnoWhy #646 | Setembro 22, 2022
Havia “serpentes voadoras ardentes” ao longo do caminho de Leí?
Postagem contribuída por
Central das Escrituras
“Enviou-lhes serpentes voadoras ardentes e, depois que foram mordidos, preparou um meio para que fossem curados. 1 Néfi 17:41
O conhecimento
Quando Néfi planejava e se preparava para construir um navio, seus irmãos começaram a murmurar contra ele, dizendo que ele era um tolo porque pensava que poderia "construir um navio [... e que ele poderia] atravessar [as] grandes águas "(1 Néfi 17:17). Em resposta, Néfi lembrou a seus irmãos os vários milagres que o Senhor havia feito durante o êxodo de Israel do Egito (ver 1 Néfi 17:23-42), incluindo o envio de "serpentes voadoras ardentes entre eles" e, depois que eles se arrependeram, "preparou um meio para que fossem curados" (1 Néfi 17:41). Os leitores modernos podem não apreciar facilmente a relevância dessa história para Leí e as circunstâncias particulares da época para sua própria família.
O encontro de "serpentes ardentes" ocorreu na região ao redor do Golfo de Aqaba, um braço do Mar Vermelho (Números 21:4-9). 1 Mais tarde, Isaías caracterizou a "serpente voadora ardente" como um dos "animais do sul", a palavra "sul" (negev em hebraico) refere-se à região desértica ao sul de Judá (Isaías 30:6).2
Os textos bíblicos não são as únicas fontes que descrevem esta região como infestada de serpentes voadoras. Um relato do rei assírio Assaradão ( 680–669 a.C.) descreve a passagem de "serpentes amarelas que abriram asas" nesta mesma região.3 O historiador grego Heródoto (aproximadamente 484–425 a.C.) também menciona ter ouvido histórias sobre "serpentes voadoras" que habitavam o deserto do Sinai/da Arábia, e ainda afirma ter visto restos de alguns esqueletos.4
Todas essas fontes indicam que as regiões desérticas ao sul de Jerusalém eram o habitat primário de serpentes voadoras e/ou ardentes.5 Esta é a mesma região por onde Leí e sua família passaram quando fugiram de Jerusalém, percorrendo "[os] limites perto da costa do Mar Vermelho" e onde acamparam, por um longo período, ao longo da costa do Golfo de Aqaba (1 Néfi 2:6).6
Na sequência, Néfi e seus irmãos passaram por essa região várias vezes, ao irem e voltarem duas vezes de Jerusalém (1 Néfi 3–5, 7). A família permaneceu perto desta área, no lugar que chamaram de Vale de Lemuel, até que o Senhor ordenou que Leí partisse (1 Néfi 16:9–11). Assim, Neal Rappleye observou: "A maior parte da narrativa em 1 Néfi ocorre nesta região, entre Jerusalém e o Mar Vermelho, em meio ao habitat tradicionalmente associado à serpente-serafim alada."7 Com base em fontes bíblicas, históricas e arqueológicas, o estudioso bíblico israelense Nissim Amzallag argumentou que "serpentes voadoras ardentes" eram identificadas como serpentes com escamas serrilhadas (Echis colaratus), víboras venenosas cujo habitat, atualmente, inclui a maioria da Arábia ocidental.8 Se esta correlação estiver correta, então Leí e sua família teriam provavelmente continuado a encontrar "serpentes voadoras ardentes" (a serpente com escamas serrilhadas) mesmo ao se deslocarem mais ao sul do deserto da Arábia.9
Néfi fez referência a serpentes voadoras ardentes quando sua família estava na terra de Abundância(1 Néfi 17:41), que provavelmente é a região produtora de incenso Dofar, em Omã.10 De acordo com Heródoto, nesta área "inúmeras serpentes aladas... vigiam cuidadosamente cada árvore [de incenso]."11 Outras fontes gregas clássicas também mencionam essas serpentes.12 Com base nos detalhes desses relatos, Amzallag argumentou que também se referem a serpentes com escamas serrilhadas, conhecidas por habitarem tanto no Iêmen, quanto em Dofar.13
As culturas do sul da Arábia que controlavam o comércio de incenso tinham símbolos e tradições relacionados a serpentes semelhantes às encontradas em Israel, incluindo a produção de artefatos que remetem à serpente de bronze de Moisés.14 Portanto, em toda a terra da promissão, a família de Leí estava no habitat — e entre as culturas influenciadas por elas — das "serpentes voadoras ardentes".
O porquê
Os estudiosos observaram há muito tempo a presença de motivos semelhantes ao Êxodo no relato de Néfi, no relato da jornada de sua família pelo deserto.15 Reconhecer como o ambiente pelo qual eles viajaram se sobrepunha e era semelhante ao do Êxodo israelita — inclusive na fauna, com serpentes de escamas serrilhadas — traz à vida quão palpavelmente semelhante ao Êxodo, foi a jornada da família. Eles enfrentaram os mesmos perigos e também tiveram que confiar no Senhor para sua proteção. Isso é especialmente evidente quando consideramos a história das serpentes ardentes (voadoras).16 Como vários estudiosos já apontaram, em Números 21:4-9, as serpentes ardentes agem como agentes do Senhor, enviadas por Ele para afligir Israel e levá-los ao arrependimento.17 De acordo com alguns estudiosos, as nuances do hebraico indicam que as serpentes foram libertas, ou soltas por Jeová, dando a entender serem um perigo presente do qual Jeová os protegeria, mas foram libertas devido à desobediência de Israel.18
Como os antigos israelitas, Leí e sua família teriam compartilhado a crença de que as serpentes ardentes voadoras que encontraram em sua jornada, eram, na verdade, agentes de Jeová. Néfi usa essa história como referência, um lembrete especialmente poderoso dos perigos reais que a família poderia enfrentar, caso não atendesse aos conselhos do Senhor. Como Rappleye apontou:
Quando Néfi lembrou a seus irmãos das "serpentes voadoras ardentes" enviadas para punir os filhos de Israel por suas murmurações (1 Néfi 17:41), isso provavelmente teve relevância para eles; diferente do que teria para os leitores atuais: eles, também, estavam viajando e acampando por regiões consideradas infestadas por serpentes voadoras e, se não fossem fiéis, o Senhor poderia facilmente puni-los soltando aquelas perigosas serpentes.19
No entanto, isso também foi acompanhado por um lembrete da graça do Senhor: assim como Ele "preparou um meio para que [os israelitas] fossem curados" ao olhar para a serpente de bronze (1 Néfi 17:41; Ver Números 21:6-9), Lamã e Lemuel, assim como o restante da família de Leí, poderiam ser curados e protegidos caso se arrependessem e buscassem ao Senhor (ver Alma 33:19-22; 37:38-47). Essa mesma bênção de cura e proteção por meio da Expiação de Jesus Cristo continua disponível para todos os que buscam e seguem ao Senhor hoje.
Leitura Complementar
Neal Rappleye, "Serpents of Fire and Brass: A Contextual Study of the Brazen Serpent Tradition in the Book of Mormon", Interpreter: A Journal of Latter-day Saint Faith and Scholarship 50 (2022): pp.217–298. S. Kent Brown, "Fiery Flying Serpents", em Book of Mormon Reference Companion, ed. Dennis L. Largey (Salt Lake City, UT: Deseret Book, 2003), p.270. Terrence L. Szink, "Nephi and the Exodus", em Rediscovering the Book of Mormon: Insights You May Have Missed Before, ed. John L. Sorenson e Melvin J. Thorne (Salt Lake City, UT: Deseret Book; Provo, UT: FARMS, 1991), pp.38–91.1. Ver Anson F. Rainey e R. Steven Notley, The Sacred Bridge: Carta’s Atlas of the Biblical World (Jerusalem, Israel: Carta, 2006), p.121. 2. Ver Joel F. Drinkard Jr., "Negev", em HarperCollins Bible Dictionary, rev. ed., ed. Mark Allan Powell (New York, NY: HarperOne, 2011), pp.694–695; Lynn Tatum, "Negeb", em Eerdmans Dictionary of the Bible, ed. David Noel Freedman (Grand Rapids, MI: Wm. B. Eerdmans, 2000), p.955. 3. Tradução em Karen Radner, "Esarhaddon’s Expedition from Palestine to Egypt in 671 BCE: A Trek through Negev and Sinai", em Fundstellen: Gesammelte Schriften zur Archäologie und Geschichte Altvorderasiens ad honorem Hartmut Kühne, ed. Dominik Bonatz, Rainer M. Czichon e F. Janoscha Kreppner (Wiesbaden, Alemanha: Harrassowitz, 2008), p.307, rev. linhas 5–7. 4. Robert B. Strassler, ed., The Landmark Herodotus: The Histories, trans. Andrea L. Purvis (New York, NY: Anchor Books, 2007), p.151. 5. Ver Robert Rollinger, "Herodot (II 75f, III 107–109), Asarhaddon, Jesaja und die fliegenden Schlangen Arabiens", em Ad Fontes! Festschrift für Gerhard Dobesch zum funfundsechzigsten Geburtstag, em 15 de setembro de 2004, ed. Herbert Heftner e Kurt Tomaschitz (Viena, Áustria: Vienna Humanistic Society, 2004), pp.927–944. 6. Sobre a rota de Leí de Jerusalém e a localização do Vale de Lemuel, veja Warren P. Aston, "Into Arabia: Lehi and Sariah’s Escape from Jerusalem", BYU Studies Quarterly 58, no. 4 (2019): pp.99–126. Veja também S. Kent Brown, "Jerusalem Connections to Arabia", em Glimpses of Lehi’s Jerusalem, ed. John W. Welch, David Rolph Seely e Jo Ann H. Seely (Provo, UT: FARMS, 2004), pp.626–629; George D. Potter",A New Candidate in Arabia for the Valley of Lemuel", Journal of Book of Mormon Studies 8, no. 1 (1999): pp.54–63. 7. Neal Rappleye, "Serpents of Fire and Brass: A Contextual Study of the Brazen Serpent Tradition in the Book of Mormon", Interpreter: A Journal of Latter-day Saint Faith and Scholarship 50 (2022): p.225. O termo "serafim" usado por Rappleye é a palavra hebraica usada para "serpente ardente" (pp. 219-220).8. Nissim Amzallag, "The Origin and Evolution of the Saraph Symbol", Oriente Antigo 13 (2015): pp.99–126. Alternativamente, Philippe Provençal, "Regarding the Noun שרף in the Hebrew Bible", Journal for the Study of the Old Testament 29, no. 3 (2005): pp.371-379, argumentou que deveria ser identificada como a cobra vermelha cuspidora (pálida naja), conhecida apenas por habitar a parte norte da Arábia, mas pode ter habitado a região mais ao sul nos tempos antigos. Richard Lederman, "What Is the Biblical Flying Serpent?" (O que é a Serpente Voadora Bíblica?), TheTorah.com, 1º de janeiro de 2015, argumentou que "é provável que Saraph não é uma espécie específica, mas refere-se a cobras em geral", incluindo a cobra egípcia (Naha haha) e a cobra árabe (naja arabica), conhecido por habitar regiões em toda a península Arábica, incluindo Iêmen e Dhofar (no sudoeste de Omã).9. See Rappleye, "Serpents of Fire and Brass", pp.224–227, documentando conexões adicionais com a narrativa da serpente de bronze/fogo e a jornada de Leí. 10. Para as duas propostas principais da localização da terra de Abundância — ambas na região de Dofar — ver Warren P. Aston, "The Arabian Bountiful Discovered? Evidence for Nephi's Bountiful ", Journal of Book of Mormon Studies 7, no. 1 (1998): pp.4-11, 70; George D. Potter, " Khor Rori: A Maritime Resources-Based Candidate for Nephi's Harbor", Interpreter: A Journal of Latter-day Saint Faith and Scholarship 51 (2022): pp.253-294. Para obter uma visão geral de cada local, ver Evidence Central,"Book of Mormon Evidence: Bountiful", Evidence #0164, 9 de março de 2021, disponível online em Evidencecentral.org.11. Strassler, Landmark Herodotus, pp.258–259. 12. Ver Nigel Groom, Frankincense and Myrrh: A Study of the Arabian Frankincense Trade (Harlow, UK: Longman, 1981), pp.59–60, 66, 70, 242n9. 13. Amzallag, "Origin and Evolution", p.107. 14. Veja, por exemplo, a serpente de bronze encontrada em al-Ḥadāʾ e datada do início do primeiro milênio a.C., em Alessia Prioletta,Inscriptions form the Southern Highlands of Yemen (Roma, Italia: L'erma di Bretschneider, 2013), pp.303-304. Para saber mais sobre o simbolismo da serpente e artefatos do Iêmen e Omã, ver Tracey Cian, "Snake Cults in Iron Age Southeastern Arabia: A Consideration on Autochthonous Developments and Possible Connections with Middle Eastern Traditions" (tese de mestrado, University College London Qatar, 2015), pp.46-87. 15. Ver Terrence L. Szink, "Nephi and the Exodus", em Rediscovering the Book of Mormon: Insights You May Have Missed Before, ed. John L. Sorenson y Melvin J. Thorne (Salt Lake City, UT: Deseret Book; Provo, UT: FARMS, 1991), pp.38–91; Mark J. Johnson, "The Exodus of Lehi Revisited", Journal of Book of Mormon Studies 3, no. 2 (1994): pp.123–126; Don Bradley, "A Passover Setting for Lehi’s Exodus", Interpreter: A Journal of Latter-day Saint Faith and Scholarship 34 (2020): pp.119–142. Rappleye, "Serpents of Fire and Brass", 249n2, cita outros estudos. 16. Sobre a equivalência de "serpentes ardentes" e "serpentes voadoras ardentes", consulte o artigo da Central do Livro de Mórmon, "Por que Néfi dijo que las serpientes podian volar? (1 Néfi 17:41)", Saiba o porquê 316 (20 de fevereiro de 2018) 17. Sobre serpentes como agentes de Jeová em Números 21 e outros contextos bíblicos e do antigo Oriente Próximo, ver Rappleye, "Serpents of Fire and Brass", pp.237-238. 18. Ver Amy Birkan, "The Bronze Serpent, a Perplexing Remedy: An Analysis of Numbers 21:4-9 in the Light of Near Eastern Serpent Emblems, Archaeology and Inner Biblical Exegesis" (tese de mestrado, McGill University, 2005), pp.65-67 . Douglas W. Ullmann, "Moses’s Bronze Serpent (Numbers 21:4–9) in Early Jewish and Christian Exegesis" (PhD diss., Dallas Theological Seminary, 1995), pp.29–30, No entanto, esta interpretação é inválida.
19. Rappleye, "Serpents of Fire and Brass", pp.226–227, as letras maiúsculas foram discretamente alteradas.